sexta-feira, 30 de setembro de 2016



30 de setembro de 2016 | N° 18648
ARTIGO - MARCELO SCHENK DUQUE*

O RISCO DO FORO PRIVILEGIADO

O aumento do número de políticos que passam a figurar na condição de réus em processos de natureza criminal, no âmbito de operações como a Lava-Jato, coloca a questão: em que medida a organização judiciária brasileira é capaz de fornecer respostas con- fiáveis e efetivas à população? Como se sabe, a Constituição Federal atribui exclusivamente ao STF a competência para processar e julgar, entre outras autoridades, políticos com mandato no Congresso Nacional. Trata-se de um problema de difícil equacionamento.

Ao contrário das instâncias ordinárias, o STF não é vocacionado para essa função. A uma, porque é encarregado, precipuamente, da guarda da Constituição e não do processamento de ações que demandam farta dilação probatória e diligências típicas da esfera penal; a duas, porque é composto por apenas 11 ministros, o que revela a incompatibilidade de recursos materiais, frente a essa complexa tarefa. Essa é a razão pela qual os julgamentos proferidos pela Justiça de primeiro grau nesse tipo de ação possuem uma velocidade incomparavelmente superior à imprimida pelo STF. O resultado é uma sensação permanente de impunidade, pela letargia dos julgamentos, que tendem a ser atingidos pela prescrição.

Esse quadro revela a inadequação do foro privilegiado à atual realidade brasileira, quando a corrupção atinge níveis avassaladores. Trata-se, a toda evidência, de uma regra constitucional equivocada, que necessita de urgente reforma. 

O problema é que muitos que se beneficiam da lentidão do STF na condução de ações penais são parte da solução, na medida em que o fim do foro privilegiado depende de um complexo processo de emenda constitucional, que tramita justamente no Congresso Nacional, palco de atuação de diversos partidos implicados em escândalos de corrupção. Sem uma pressão popular ordeira, determinada e visível, dificilmente Brasília irá corrigir essa deturpação. E o risco, mais uma vez, é de a corrupção triunfar sobre a moralidade, a par de todo esforço até aqui expendido. Algo de que precisamos, de fato, é mais Moro e menos foro.

*Professor universitário, doutor em Direito Constitucional

Nenhum comentário: