30 de outubro de 2015 | N° 18340
ARTIGOS - PAULO DE ARGOLLO MENDES*
O LOUCO E O TREM
Há cerca de dois séculos, um médico (Philippe Pinel) rompeu as correntes que amarravam os “loucos”, mostrando que não eram criminosos, mas doentes. Mas só nas últimas décadas a medicina alcançou avanços científicos capazes de, através de medicamentos, interromper o curso natural das doenças que, quase sempre, evoluíam para a cronificação e o retardamento mental.
Esses novos medicamentos reduziram a internação psiquiátrica a apenas duas situações: risco para a própria vida (suicídio) ou para a de outrem (homicídio). Aqueles que hoje adoecem dificilmente precisam ser internados e, quando o são, é por curtíssimo tempo (tanto que o SUS só paga 21 dias).
Fazer um movimento para tirar os “loucos” dos hospitais é hoje como fazer um movimento contra a poluição da maria-fumaça. A evolução extinguiu o trem a carvão, não é preciso fazer lei para impedir sua construção.
Ficaram, no entanto, os sequelados, aqueles que tiveram a doença mental antes que se desenvolvessem drogas para curá-los (ou, ao menos, mantê- los sob controle ambulatorial, como um diabético). Esses são os chamados “crônicos ou asilares”. Pessoas que não representam risco, mas não são capazes de cuidar de si mesmas.
O dito Movimento Antimanicomial deu aos asilares o “direito cidadão” de serem expulsos de suas camas (quantos pularam de volta, para dentro, os muros do São Pedro) e transformados em moradores de rua, “finalmente livres”!
O número de enfermos realmente diminuiu. Sem noção do que faziam, muitos foram atropelados. Outros, sem agasalho ou comida, morreram de pneumonia ou tuberculose. E entraram para as estatísticas como acidentes ou mortes por causa natural, não como assassinatos.
O preconceito contra o doente mental permanece. É permitido construir hospitais especializados em cardiologia ou em pneumologia, mas não em psiquiatria. A velha e discriminatória Lei Antimanicomial ainda não foi abolida. A recente Parada do Orgulho Louco mostra como ainda nos falta olhar com afeto e respeito a esses indivíduos e parar de tirar proveito (inclusive eleitoral) de suas enfermidades.
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