segunda-feira, 12 de outubro de 2015



12 de outubro de 2015 | N° 18322 
LUIS FERNANDO VERISSIMO 

Formigas vagabundas


Mais um mito destruído. Li que pesquisadores americanos que estudavam o comportamento das formigas descobriram que metade delas não tinha nenhuma função no formigueiro. De 225 formigas observadas, 103 eram ociosas. Enquanto as outras se dedicavam às suas tarefas e trabalhavam como, bem, como formiguinhas, as ociosas não faziam nada. Presumivelmente, só atrapalhavam.

Não se deve, claro, tirar conclusões apressadas da descoberta. As ociosas podem muito bem ser formigas aposentadas, depois de uma longa vida de trabalho. Os pesquisadores especulam, também, que as inativas formariam uma espécie de exército de reserva, que só entraria em ação para defender o formigueiro de inimigos externos ou intervir em conflitos internos, um pouco como a Força Nacional, no Brasil. Outra hipótese é de que as ociosas produziriam comida para as operárias, regurgitando o açúcar líquido que guardam em seu abdômen para alimentá-las, e que esta seria sua única função, nojenta mas respeitável.

O fato é que formigueiros não são exatamente como se pensava, e podemos nos sentir desagravados. Há anos comparam a sociedade humana com a dos chamados insetos sociais, que deveriam nos servir de modelos. Formigueiros, colmeias e etc. eram exemplos de organização política e produtiva que nos envergonhavam pelo contraste. 

Os insetos altruístas nascem e vivem para um fim específico e definido que quase sempre envolve o sacrifício do indivíduo pela coletividade, outra lição que nos davam. Também havia a força lendária das formigas, capazes de carregar várias vezes o próprio peso, o que também nos humilhava.

A revelação de que existem formigas vagabundas acaba com o mito da superioridade moral dos insetos. A vida das abelhas continua a ser uma coisa fascinante, mas uma colmeia não deixa de ser uma monarquia absoluta que jamais vai virar República, como tantas das nossas viraram. E não temos mais por que invejar a ordem dos formigueiros. Com as suas classes ociosas vivendo do trabalho dos outros, as formigas não são muito melhores do que nós.

PAPO VOVÔ

Lucinda, nossa neta de sete anos, anunciou que inventara uma piada. Tinha duas notícias, uma boa e uma má. A notícia má era que não havia notícia boa. Sem saber, fez um resumo perfeito do Brasil de hoje.

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