24 de outubro de 2015 | N° 18334
NILSON SOUZA
IMPEACHMENT DE PADRINHO
Nunca tive medo de mau tempo, literalmente falando. Quando criança, enquanto minha mãe tapava os espelhos e acendia palhas bentas pela casa, eu gostava de ficar na janela observando os relâmpagos – talvez com o pensamento ingênuo de que a vidraça me protegia. Isso que naquela época remota os adultos costumavam assustar as crianças com a história de um tal de corisco, faísca elétrica emitida pelas nuvens que podia entrar por qualquer fresta da casa e causar estragos impensáveis.
Jamais pensei – como os gauleses da aldeia de Asterix – que o céu pudesse cair sobre as nossas cabeças. Mas já estou revendo esta posição, principalmente depois que nuvens negras carregadas de água, barras de gelo e raios resolveram estacionar sobre o Rio Grande. Não passa semana sem que várias cidades gaúchas sejam bombardeadas por saraivadas de granizo. Isso que o nosso padroeiro é São Pedro, aquele que ganhou as chaves do céu para ligar e desligar o que bem entendesse.
Por Tutatis, São Pedro, fecha essa torneira!
Mesmo com esse padrinho influente, dia desses acho que estivemos bem próximos do fim do mundo. Foi naquela quarta-feira em que uma tempestade desabou sobre a Capital, com o estrondo de mil canhões. Assim que o barulho começou, fui para a área da minha casa filmar os relâmpagos. Mas aquilo não terminava nunca e foi se aproximando de forma cada vez mais ameaçadora. Quando caíram as primeiras pedras de granizo, corri para dentro. Mas o que mais me assustou nem foi a chuva sólida ou a ventania: foi o ruído dos trovões – insistente, continuado, crescente. Dava a impressão de que alguma coisa terrível estava chegando, e não chegava nunca. Ô, agonia!
O mundo não terminou naquela noite, mas a tempestade derrubou árvores, destelhou casas, inundou cidades e deixou milhares de desabrigados. Depois dela, outras chuvas já despencaram sobre nossas cabeças, fizeram rios transbordar, destruíram lavouras e causaram mais sofrimento, especialmente às populações carentes.
E São Pedro, nada.
Já ando pensando se não seria o caso de ameaçá-lo com um pedido de impeachment.
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