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segunda-feira, 31 de maio de 2010
31 de maio de 2010 | N° 16352
Paulo Sant’Ana
A morte sob o tapete
Divulga-se que de 2002 para cá cerca de 45 mil brasileiros sofreram amputação de pernas, pés e dedos, originada em diabetes sem diagnóstico.
Funciona assim: os pacientes não sabem que têm diabetes, quando acorrem aos hospitais com feridas, não podem mais evitar a amputação de seus membros, em fase adiantada de necrose.
Essa é uma das faces trágicas da pobreza e omissão do serviço de saúde pública brasileiro.
Não só o diabetes apresenta este quadro, também a tuberculose e a dengue, que em grande parte das vezes só têm revelado seu diagnóstico tardiamente, depois que as lesões se tornam irreversíveis.
Tal é a sorte da população brasileira abandonada pelo sistema de saúde.
Entidades dedicadas à prevenção e combate de doenças afirmam que o número de 45 mil amputações entre 2002 e 2010 é subavaliado: se só no Rio de Janeiro, apenas em 2009, houve quase mil amputações, como pode em todo o país, em oito anos, ser de apenas 45 mil o número de amputados?
Dizem essas entidades que o número real de amputados no Brasil é de 40 mil por ano.
A exemplo da tuberculose, da hanseníase e da dengue, a omissão do sistema de saúde em diagnosticar diabetes, com os pacientes só conhecendo que têm as doenças quando suas lesões se tornam irreversíveis, atira milhões de pessoas à desgraça.
Este fato revela que em matéria de saúde pública o Brasil vive no tempo das cavernas.
E não só por falta de recursos, muitas vezes o SUS gasta mais com moléstia diagnosticada tardiamente do que teria gasto se houvesse prevenção.
Eu desabo no mais profundo desânimo quando venho a saber que 40 mil brasileiros têm suas pernas, pés e dedos amputados por simplesmente não saberem que eram portadores de diabetes.
São 45 mil pessoas amputadas por ano. 45 mil que se tornam inúteis e deficientes, marginalizando-se no meio social.
Isso é um holocausto, uma hecatombe.
O nosso sistema de saúde é dominado pela hipocrisia, ele sabe que as pessoas morrem aos milhões sem assistência médica, ele conhece que outros milhões restam mutilados por diagnóstico tardio ou pela fila angustiante da cirurgia, vai fazendo o que pode, mas esconde debaixo do tapete uma mancha escabrosa de morte e de dor em milhões de brasileiros desassistidos.
O SUS gasta muito dinheiro e ainda assim presta relevantes serviços ao país. Mas carece de uma carga maior, muito maior de recursos.
Nem o governo Fernando Henrique, nem o governo Lula tiveram coragem para enfrentar a questão da Saúde e se notabilizaram em deixar como rastro de seus mandatos a chaga escabrosa de milhões de mortos, mutilados, aleijados, amputados, na fila das cirurgias e das consultas ou nas sombras do não diagnóstico.
Só se poderia regenerar esta vergonhosa omissão se quem suceder a Lula decretar como questão prioritária nacional a Saúde.
Como isso, a julgar pela pré-campanha à Presidência, não vai acontecer, continuaremos mergulhados num mar de choro e ranger de dentes.
A saúde no Brasil é presidida pela morte.
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