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terça-feira, 18 de maio de 2010
18 de maio de 2010 | N° 16339
MOACYR SCLIAR
Um passo importante. Mas só um passo
Durante a visita à Rússia, Lula disse que havia 99% de chances de chegar a um acordo com o Irã acerca da questão nuclear. O presidente russo, Dmitri Medvedev, não foi tão otimista: afirmou que as chances eram de 30%.
Apostas, portanto. Sugerindo que atrás das negociações havia um jogo tão incerto quanto importante. Um jogo no qual Lula apostava alto, mas com algum fundamento: se falhasse, sempre poderia dizer que, no mínimo, havia tentado dar sua contribuição para solucionar o complicado problema.
Resultou da reunião um acordo pelo qual o Irã enviará o urânio à Turquia, de onde, teoricamente, voltará pronto para ser usado com fins pacíficos, não como potencial componente de bombas nucleares.
De brinde, o governo iraniano libertou a professora universitária francesa Clotilde Reiss, que estava presa havia 10 meses, acusada pela justiça iraniana de ter participado de manifestações antigovernamentais e, grave crime, de ter tirado fotos de ditas manifestações. Lula demonstrou a importância do Brasil no cenário internacional, coisa que certamente deve ter feito Chávez morder-se de inveja. Como disse Dilma Rousseff em entrevista, o presidente marcou um gol.
Aí, porém, começam as restrições. Paralelamente ao acordo, o governo iraniano vai prosseguir por sua conta no processo de enriquecimento do urânio, o que introduz um elemento de suspeição, já que a partir de certo limite o urânio enriquecido pode ser usado para fabricar uma bomba.
E o próprio acordo não substitui aquele que deve ser feito com a ONU através da Agência Internacional de Energia Atômica. De outra parte, diante do repúdio de muitos países e da forte oposição popular, é possível que o Irã esteja em processo de mudança, inclusive em relação aos Estados Unidos de Obama. O acordo seria o começo dessa mudança.
Mas é só um começo. Para um governo que faz da intolerância a sua plataforma básica, não é suficiente. É preciso avançar mais. É preciso que os fundamentalistas respeitem as mulheres, as minorias sexuais e outras religiões, como os baha’is, tradicionalmente perseguidos. É preciso que uma democracia autêntica seja restaurada.
E é preciso que Ahmadinejad pare de negar o Holocausto e de clamar pela destruição de Israel, como o lembrou a manifestação no Rio de Janeiro, na qual 6 mil mãos estilizadas (representando os 6 milhões de mortos nos campos de concentração nazista) foram colocadas na areia da praia. Destas vítimas, o presidente iraniano deve lembrar.
Lula mostrou mais uma vez suas qualidades de hábil negociador. Coisa que aprendeu na atividade sindical, e que o consagrou no governo, ainda que tenha gerado descontentamento entre antigos aliados. Voltando à metáfora futebolística de Dilma, ele realmente marcou um gol. Não foi um gol contra, como dizem as más línguas, mas não foi um gol decisivo, o gol da vitória. Vamos torcer para que desta tensa partida resulte, senão uma goleada, pelo menos uma vitória concreta para a democracia, para a paz, para o bom senso.
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