sábado, 29 de maio de 2010



29 de maio de 2010 | N° 16350
PAULO SANT’ANA


Suicídio e homicídio

Policiais, jornalistas, autoridades de trânsito restaram perplexos anteontem e ontem: em apenas três acidentes, sete jovens masculinos perderam a vida em menos de oito horas.

Nos três episódios, havia a marca do excesso de velocidade, das manobras arriscadas e uma suspeita em alguns deles de consumo de álcool.

Todos homens, todos jovens.

Um acidente em Picada Café, outro em Três de Maio e o terceiro nas proximidades do centro de Porto Alegre, confluência da Cristóvão Colombo com Alberto Bins.

E sete famílias choram agora as mortes de seus filhos, irmãos, tios, inexplicavelmente separados deles pelo delírio da velocidade no volante.

Um traço comum dos três acidentes que vitimaram os sete jovens é que eles se verificaram à noite.

Acidente à noite sempre presume álcool, saída de festa, excesso de velocidade por ausência de engarrafamentos. As ruas, avenidas e estradas passam a ter pouco movimento e o cenário para a aventura das diabruras no volante e o pé no fundo do acelerador se torna propício às tragédias.

Surgiu ontem à noite a informação de que um desses três jovens que dirigiam os três carros trágicos de ontem e anteontem, na semana passada, havia ele mesmo tirado uma foto do velocímetro de seu próprio carro, que marcava naquele instante 195 km/h de velocidade.

E mostrava a seus amigos no dia seguinte a foto da sua façanha: imprimindo 195 km/h em plena freeway.

Jactando-se em sua turma de sua velocidade emocionante e macabra.

Ontem, morreu espatifado no acidente.

Esses jovens, como milhares que há por aí, não usam o automóvel para trafegar: usam-no para exibir-se, usam-no para a delirante aventura da velocidade, parecem cegos ao bom senso, movem-se apenas pela delícia de superarem, pelas manobras arriscadas e pela compulsão saborosa de baterem todos os recordes de velocidade, os outros motoristas do trânsito.

Se dirigissem sós os seus carros fúnebres, não era nada, é certo que acabariam morrendo, como tantos outros vão acabar.

Mas é que eles se juntam com outros jovens que pegam carona em seus carros e são assim colhidos pela morte.

Usam os carros como brinquedos, como jogos, sem se importarem que esses mesmos carros são armas potentes e hábeis para a destruição da vida humana.

Na repressão a esse tipo de direção perigosa em veículos, o Direito e a Justiça esbarram num sério obstáculo: a falta de intenção dos motoristas em causar as mortes.

Eles apenas assumem o risco de causar as mortes dirigindo perigosamente. Mas não queriam o resultado das mortes, deveriam apenas presumi-lo. Assim, as penas se tornam mais brandas, eles não são considerados assassinos, e sim irresponsáveis.

Na verdade, são suicidas em busca de prazer e de aventuras de risco.

Mas se tornam sob certo aspecto homicidas quando convidam outros jovens para entrar em seus carros e servir de plateia para seus atos tresloucados. Ou quando se chocam com outros carros com tripulantes dentro. Ou quando atropelam inocentes e indefesos pedestres.

Em tudo isso, dói assistir à dor profunda e permanente de seus parentes pósteros, que sob certo aspecto já imaginavam que tudo um dia iria acabar em catástrofe.

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