quarta-feira, 8 de novembro de 2023



08 DE NOVEMBRO DE 2023
MÁRIO CORSO

Deficiências ocultas

No aeroporto de Londres, uma companhia aérea usava uma fita com girassóis para identificar pessoas com deficiências não aparentes. Como surdez, transtorno do espectro autista, certas neurodivergências e tantas mais. A função era para a rápida identificação de quem precisa de mais ajuda, acessibilidade particular ou prioritária.

O girassol foi escolhido por ser uma planta resistente e resiliente. A ideia começou a ser copiada e transformou-se em um símbolo internacional para identificar pessoas com dificuldades ocultas. Em junho, o Senado aprovou este símbolo como marca visual desta condição também no Brasil. Ele é opcional e não dispensa o documento probatório da deficiência, caso seja solicitado pela autoridade competente.

Que uma condição, deficiência ou doença não seja visualmente aparente faz uma enorme diferença para o portador. Temos dificuldade em acreditar no que os olhos não confirmam. O primeiro raciocínio nessa esfera é: essa pessoa está querendo tirar vantagem, é coisa da sua cabeça, não é bem assim, exagera, é malandragem. O pensamento leigo sobre saúde acredita que se alguém aos seus olhos parece bem, então está bem.

O esquecimento do corpo foi subproduto de negar a força do erotismo em nossas vidas. As religiões ocidentais nos fizeram crer que o espírito - seja lá o que isso for - está acima, e não unido ao corpo que o carrega. Nossas dificuldades com um corpo não perfeito, com a decrepitude, com a doença e as síndromes ocorrem porque elas denunciam a fragilidade corporal. Envelhecer é reencontrar-se com o corpo. Afinal, corpo também faz destino.

Descobri por experiência o que é invisibilidade. Nunca me recuperei de todo da covid. Sofro de fadiga crônica, entre outros estragos menores. Com uma vida regrada, exercícios e perda de peso, estou, na aparência, melhor do que antes. Logo, "estaria bem". Dia sim, dia não, ganho dos amigos e conhecidos o atestado de curado. Tomo como carinho, eles me querem bem. Desisti de contrariar o veredito, até porque não funciona. Ninguém gosta de incapacidades e doenças. Falar delas é coisa de velho.

Síndrome pós-covid, doenças e dores crônicas são acompanhadas de doses diárias de solidão. Ela chega pela invisibilidade, pela incomunicabilidade e pela incompreensão da nossa condição. Haja resistência e resiliência. Comprei um vaso de girassol para conversar e pedir conselhos.

MÁRIO CORSO

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