25 DE NOVEMBRO DE 2023
CARPINEJAR
Discriminação sofrida pelos namorados no luto
Namorados enlutados são excluídos, como se não fossem da família, como se fossem coadjuvantes de quem partiu. Morrem junto.
Não há um inventário, uma partilha, um documento para mostrarem sua importância, para provarem sua influência afetiva. Como não tiveram chance de casar, de dividir oficialmente os bens, permanecem nas fileiras de trás no adeus.
Foram interrompidos pelo acaso, foram suspensos pelo destino. A atualidade do vínculo não é lembrada. Mesmo se moravam com o falecido, ainda não contavam com o reconhecimento de uma união estável entre os mais próximos. A dor deles é silenciada, obscurecida. São dispensados sumariamente dos abraços de pêsames.
Os namorados sofrem o dobro quando perdem quem amam. Porque recai sobre eles o preconceito da invisibilidade. Eles deixam de existir com a morte do seu companheiro ou companheira, rebaixados a uma figura eventual, de um momento, de uma fase. O valor deles vinha exclusivamente de quem não se encontra mais ali para defendê-los.
Não são consultados para o velório e para o enterro, não são chamados para dar um depoimento, não são ouvidos a respeito dos sonhos e das últimas vontades, não são convocados a carregar uma das alças do caixão. Surgem nas exéquias na condição de penetras, tendo que guerrear por uma cadeira na reunião familiar, lutar por um canto na cabeceira do finado.
Desidratam-se de lágrimas, choram mais do que todos, e acabam escanteados pela distância do cartório, por não ter um sobrenome igual, sem poder proclamar laços de sangue, sem poder reivindicar uma ligação aprofundada. Representam viúvos do presente, viúvos ocasionais, viúvos circunstanciais. Sua viuvez não é levada a sério. Desempenham um papel desprovido de papel.
O entendimento social é de que, se eles fossem realmente relevantes, não estariam "apenas" namorando. Seriam mais do que isso, como se o namoro significasse quase nada no fim de uma vida, meros trocos de um legado.
É subtraído, de repente, o direito de chamar os sogros de sogros. A nomeação dependia do futuro, agora abolido.
Recebem uma atenção discreta e secundária, com a intimidade roubada pela morte súbita. O tratamento é uma injustiça, já que passavam o maior tempo com o morto. Talvez conheçam o morto mais do que um pai, ou uma mãe, ou um irmão.
Viam-no diariamente, mostravam-se inseparáveis e cúmplices, dividiam segredos e juras, novidades e medos. Não o largavam na convivência, com projetos e planos a serem cumpridos. Davam as mãos na claridade pública e os pés na noite da privacidade.
Se não apresentam antiguidade no lar do outro, têm imenso domínio do passado recente: são aqueles que melhor sabem o que o ausente pensava, sentia, queria antes da sua despedida, os únicos cofres que guardam intactas as esperanças do seu par.
Pena que os namorados levam os segredos consigo, jamais convidados a participar da convivência do luto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário