03 de janeiro de 2016 | N° 18403
ARTIGOS - DIANA LICHTENSTEIN CORSO*
UM CONSOLO A CADA ESQUINA
Não sei se é só Porto Alegre que vive uma invasão de farmácias. Edificações vêm abaixo ou se transformam para dar lugar a esses bem iluminados, coloridos e amplos negócios. Lá há substâncias que dão conta de cabelos e pele irretocáveis, dores no corpo e na alma, síndromes que nossos avós nem sequer suspeitavam que fossem possíveis. Você pode adquirir uma variedade de vitaminas que fariam Popeye dominar o mundo e até, se fizer questão, remédios realmente necessários.
Não estou aqui para olhar de fora, sou hipocondríaca profissional e adoro pílulas milagrosas para meus males. Também sou capaz de perder bastante tempo escolhendo produtos de higiene que tornem meus dentes alvos, minha pele uma seda e meus cabelos esvoaçantes. Porém, com a chegada dos 50 anos, há o perigo de sair com os cabelos alvos, os dentes esvoaçantes, mas...
Além das farmácias, são também endêmicos os salões de beleza, agora rebatizados de estéticas, assim como as lojas especializadas em animais domésticos, as pet shops. As primeiras, no passado recente, cuidavam dos cabelos, unhas e ocasionalmente uma maquiagem para festas. Hoje estendem seus serviços muito além do enfeite: pele, gorduras e todo tipo de supostas irregularidades encontram ali alívio e correção. Já as pets são lugares totais. Mistura de cuidados de saúde, estética, creche e loja, oferecem atendimento imediato, doutores 24 horas. Do jeito que andam as emergências dos nossos hospitais, ando invejando minha gata.
O que isso diz de nós?
Que acreditamos em substâncias mágicas: os remédios. Eles de fato são maravilhosos ao combaterem a dor e a morte. Porém, os usamos também para males menores, bastante vagos, assim como esperamos deles proteção e vitalidade. Sem dúvida, nas farmácias encontra-se a alquimia das soluções imediatistas, basta engolir.
Que cuidamos dos animais porque nos oferecem um afeto tranquilo e previsível. Para eles, toda forma de amor vale a pena, são fiéis e devotados, raramente pedem divórcio e, ao contrário dos filhos, moldam-se às expectativas dos “pais”. As pessoas nos cansam com suas exigências e neuroses, nunca sabemos o que esperar de um amor entre humanos.
Já as estéticas são como uma mãe de aluguel que cuida, massageia, nos alisa, elogia, colore e enfeita. Até porque as mães descuidam, esquecem, acreditam que crescemos. Pagando, o mimo é garantido e vitalício.
Por isso, consumimos banhos e tosas, esmaltes, cremes, drenagens e luz pulsada, perlimpimpim, vitaminas, analgésicos e calmantes. Como não ter uma pet shop, uma estética e uma farmácia a cada esquina? A conclusão é inevitável: tornamo-nos uma civilização preguiçosa, imediatista e carente. Dá uma vergonha, né?
Psicanalista - zhora.co/DianaCorso
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