Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 16 de maio de 2009
17 de maio de 2009
N° 15972 - DAVID COIMBRA
O Maior Estacionador Vivo
Dias atrás, dei uma estacionada que deveria colocar no meu currículo. Rodava mansamente pela rua e vi aquela pequena vaga. Era bem pequena mesmo. Acoplando o meu carro ali, sobraria dois dedos de cada lado. Ainda assim, parei um pouco à frente e acionei o pisca. Havia dois caras conversando na calçada. Trabalhavam nas cercanias, creio. Um deles estava de macacão. Foi esse que comentou alto:
– Não vai dar...
Estava sendo desafiado. Pensei nos centroavantes, homens impávidos que crescem na hora da decisão. Bem. Aquilo era uma decisão. Se não conseguisse instalar o carro na vaga, cairia em opróbrio. Já estava até vendo aqueles dois me ridicularizando pela vizinhança.
Poderia simplesmente engatar a primeira e procurar uma vaga mais aberta, mas não sou homem de desistir com facilidade, ah, não! Lembrei do meu amigo Ivan Pinheiro Machado, que se jacta de ser “O Maior Estacionador Vivo”. Já observei o Ivan estacionando.
Ele o faz de modo casual, em dois rápidos movimentos. Gira a direção para lá, depois para cá e, sem olhar muito pelo retrovisor, zup!, estaciona nas vagas mais exíguas, como se o carro fosse um apêndice do seu corpo.
Pensei na história do arqueiro zen. Não pensar na coisa, eis o segredo. Deixar que seu corpo aja por você. Naturalidade. Serenidade. Bamo lá!
Respirei fundo. Girei a direção toda para o lado esquerdo, engatei a marcha a ré e, em quatro segundos, virei o volante com vigor para a direita, isso tudo sem parar, sem hesitar, sem nem respirar. Zup! O carro acomodou-se na vaga como se tivesse feito isso por vontade própria.
Puxei o freio de mão. Abri a porta. Saí do carro rodando a chave no indicador.
Olhei de soslaio para os dois caras na calçada. Estavam boquiabertos. Comentei:
– Será que chove? E fui embora sem olhar para trás, eu, o Rei da Baliza.
Modestamente, garanto ser autor de outras façanhas que poderia acrescentar no currículo. Lançamentos de 60 metros que voavam sobre as cabeças pasmadas dos dois times e aterrissavam no pé do Jorge Barnabé, na ponta-direita do Alim Pedro. O meu irresistível drible da levantadinha. Meu arroz de china pobre. O Bernardo – se tivesse vídeo no currículo, colocaria um do Bernardo tocando uma gaitinha de boca que ganhei.
Agora, poucas glórias teriam maior destaque no meu currículo do que alguns telefonemas que recebia, tempos atrás. Sabe quem me ligava?
Mafalda Verissimo.
Por Deus. Dona Mafalda Verissimo, esposa de Erico, mãe de Luis Fernando. Ligava para comentar minhas colunas. E gostava delas! Não vale uma estrelinha coruscante no currículo?
Outra vez, o próprio Luis Fernando escreveu sobre mim no jornal. Juro. E dia desses ele me enviou um email.
A princípio, fiquei surpreso. Lembro que, quando os primeiros computadores foram instalados na Zero, o Verissimo resistia e batia sua coluna à máquina. A única máquina datilográfica da redação era a dele, um monumento teimoso a um tempo que se esvaía. Esta semana mesmo ele escreveu com algum ressentimento sobre o computador. Será que já estaria operando o correio eletrônico? Mas depois lembrei de algo que vi.
Vi, ninguém me contou: Luis Fernando Verissimo instalando seu laptop num estádio da Copa do Japão. Ele chegou sozinho ao reservado de imprensa. Caminhava devagar, sobraçando a maleta do notebook.
Encontrou seu lugar. Agachou-se mundanamente para procurar a tomada escondida debaixo da mesinha de trabalho. Plugou o notebook, e ao fazê-lo exalou um suspiro de resignação. Abriu-o.
Começou a escrever. Fiquei pensando que o Luis Fernando Verissimo bem merecia ter um secretário para exercer essas funções mecânicas, e que a tecnologia, afinal, nos aproxima tanto que ofusca a fidalguia.
Mas o email do Verissimo. Não era um elogio. Era uma correção. Eu havia escrito sobre Noronha, o centromédio que Oswaldo Rolla, o Foguinho, me disse ser o melhor jogador que ele viu jogar, ele que tantos viu jogar. Pois bem. Verissimo observou que Noronha era médio pela esquerda, uma espécie de lateral na época, anos 40.
Formou uma famosa linha média no São Paulo: Bauer, Rui e Noronha. Certo. Mas é que, no Grêmio, Noronha jogou de centromédio. Ao se transferir para o São Paulo é que foi deslocado para a esquerda, de onde acabou na Seleção.
Essa semana apresentei a mesma explicação para outro prócer do jornalismo, Carlos Bastos, a quem encontrei na Assembleia Legislativa por ocasião da homenagem aos 45 anos de ZH. Bastos viu Bauer, Rui e Noronha em ação. Descreveu lances preciosos deles três.
E contou algo para mim inédito: em 1953, o Grêmio recontratou Noronha só para jogar um Gre-Nal. O Inter possuía um time superior, e o Grêmio queria evitar a derrota a qualquer custo.
Noronha jogou lá atrás, formando zaga com o bravo Pipoca, seja ele quem for. Pois Noronha mascou o jogo de tal forma, eludiu e iludiu, negaceou e rodou e desfez, mais do que fez, e tudo isso com tal mestria, que conseguiu: o Gre-Nal terminou em 1 a 1. Uma bela história. As belas histórias que já aprendi, essas também poderiam ir para o meu currículo.
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