sábado, 21 de fevereiro de 2009



22 de fevereiro de 2009
N° 15887 - CRÔNICA | Cláudia Laitano


Exemplos

O senso comum diz que as mulheres costumam puxar o tapete umas das outras. Dado que o senso comum muitas vezes reflete um ponto de vista masculino sobre o mundo, faz sentido acender uma luz vermelha de desconfiança de vez em quando.

Até onde eu tenho visto, homens são puxadores de tapetes tão hábeis quanto mulheres – por motivos tão universais quanto medo, paixão, ambição ou pura e simples falta de caráter.

O que se comenta menos é o quanto as mulheres aprendem com as mulheres que admiram. Ao contrário do que muitos homens pensam, não é só nas roupas e no namorado das outras que a gente repara. Observadoras atentas do comportamento alheio (esse é o nosso futebol...), mulheres usam outras mulheres como modelos do que elas poderiam ser se esforçassem um pouco mais – ou apenas dessem menos bola para o senso comum.

Talvez por isso a revolução de comportamento que mudou o papel social das mulheres no mundo ocidental nos últimos 40 anos tenha sido tão avassaladora. À certa altura, as meninas começaram a ver algumas mulheres fazendo coisas diferentes do que as suas mães e avós faziam e pensaram: acho que vou por aí. E foram.

Nesta primeira década dos anos 2000, as garotas que foram jovens nos anos 60 estão começando a chegar aos 60. Marieta Severo, Rita Lee, Marília Gabriela, Meryl Streep, a gente olha para elas e pensa: essas senhoras estão inventando um novo jeito de chegar à maturidade.

Nem tão frenéticas a ponto de parecerem estar fazendo de conta que o tempo não passou – nem tão acomodadas a ponto de achar que seu tempo “já” passou. Nós, as quarentonas, olhamos para essas mulheres e, subitamente, a ideia de envelhecer não parece tão assustadora – se a gente pode, como elas, continuar namorando, trabalhando e rindo de si mesmas sempre que possível.

O problema é que a situação contrária, ver mulheres famosas dando maus exemplos, também nos afeta de alguma forma. Porque o raciocínio é mais ou menos este: se essa moça poderosa e bem-sucedida está fazendo esse papelão, o que sobra para nós?

Foi o que eu pensei vendo os cartazes do filme Austrália, com Nicole Kidman no papel principal. Prestem bem atenção na foto e me digam se aquele lábio superior levantadinho estava ali na última vez em que você olhou. Ao meu olhar leigo e incrédulo, parece que uma das mais belas e talentosas atrizes da minha geração acaba de retocar a vizinhança do seu narizinho arrebitado – para desfazer sabe-se lá que defeito imaginário.

Meg Ryan, que nem chegou aos 50, fez uma recauchutagem desastrada que a deixou precocemente parecida com o roqueiro Serguei, o que já foi assustador, mas Meg Ryan nunca teve a beleza, o talento e a elegância da ex-mulher de Tom Cruise. Vê-la desfigurar o próprio rosto nos causa não só o inevitável estranhamento estético, mas uma profunda decepção, como se ela estivesse traindo uma causa.

O lábio novo de Nicole Kidman é quase um alerta ecológico, o derretimento das geleiras do bom senso (que ela parecia ter) – e uma profecia apocalíptica demais para nós, mulheres atentas ao comportamento umas das outras, ignorarmos. Ou a gente aprende a lidar com a idade de uma maneira mais inteligente ou no futuro – o que pode ser na semana que vem mesmo – todas teremos a cara do Serguei.

Marietas Severos deste mundo, benditas sejam, nos salvem desse destino cruel.

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