31 DE AGOSTO DE 2017
DAVID COIMBRA
Homens antigos
Fui encontrar os velhos amigos de infância, caras com quem joguei botão e bolinha de gude, colegas de time, companheiros de farras. Nós atravessamos a infância e a adolescência juntos, fomos testemunhas do começo das vidas uns dos outros.
Quando cheguei, o Fernando já estava lá, atrás de uma cerveja gelada. Ao abraçá-lo, notei uma novidade. - Que que é isso? - apontei para o objeto apoiado na mesa. Era uma bengala.
- Tive um probleminha aqui na perna esquerda - ele explicou. - O médico mandou eu sair com isso para me sentir mais seguro.
- Ah... Um probleminha...Sentamos. O garçom colocou mais um copo na mesa.
- E o Cavalo? - estranhei. O Amilton Cavalo nunca se atrasa.
- Vai ver é o trânsito.
Antes que pudéssemos reclamar do trânsito, chegou o Jorge Barnabé. Veio rindo, como de hábito. O Jorge sempre foi um sujeito tranquilo e bem-humorado. Era um ponta-direita veloz, de chute firme e seco. Sabia irritar os adversários, mas nunca se metia em brigas. Podia até provocá-las, só que, depois, quando todo mundo se engalfinhava, ele ficava assistindo de um canto.
Não sei como, com toda essa calma, foi ter um infarto, tempos atrás. Os médicos serraram o peito do Jorge do pescoço ao umbigo e afastaram os ossos até abrir um buraco por entre o qual podia passar o coração. Então, eles lhe arrancaram o coração do peito e o deitaram em uma bandeja. Enquanto uns o consertavam, outros ligaram o Jorge a uns aparelhos que o mantiveram vivo. Feito o reparo, botaram o coração lá dentro outra vez e o fecharam.
Como é que eles conseguem fazer uma coisa dessas?
- E o Cavalo? - perguntou o Jorge.
- Trânsito...
Pedimos outra cerveja. Ficamos ali, rolando conversa mesa abaixo, até que o Amilton Cavalo entrou no bar. Veio com um grande colar cervical em volta do pescoço. Arregalamos os olhos:
- O que aconteceu??? - Hérnia de disco.
Então me ocorreu: o Fernando de bengala, o Jorge com uma cicatriz lhe dividindo o peito que nem o Mississipi divide os Estados Unidos, o Amilton dentro de um colar cervical e eu também cá com minhas contingências, nós, que passávamos todo o dia de domingo no futebol e toda a noite de sábado na esbórnia, nós, agora, sentimos os efeitos do tempo. Mas, sentado à mesa com os parceiros da vida inteira, rindo e bebendo com eles, podia até sentir esses tais efeitos do tempo sem me sentir velho. Ao contrário: parecia que tinha de novo 16 anos de idade.
Porque é assim que é. O homem que não se cansa de aprender e que mantém o interesse pelos seus afetos pode até ser antigo, mas não será velho. Nós quatro, ali, éramos quatro guris de cabelos grisalhos. Menos o Jorge. O Jorge jura que não, mas aposto que ele pinta o cabelo.
Empresa jovem
Hoje, a RBS completa 60 anos. É mais velha do que nós quatro que estávamos naquela mesa, portanto. Tudo de relevante que ocorreu no tempo que vivemos até agora foi registrado pela RBS. Não é pouca coisa.
Como já disse: uma pessoa pode prosseguir cheia de vigor por décadas se continuar aprendendo e sentindo afeto pelos seus afetos. E uma empresa pode varar a poeira dos séculos se conseguir se adaptar às mudanças da sociedade. O processo é o mesmo: é preciso aprender sempre e manter sempre o interesse nas pessoas.
A RBS, que se renova sem parar, consegue tal façanha. É uma empresa estuante de energia, mas plena de experiência. Com uma vantagem na parte física: basta mudar de prédio ou trocar de equipamento, que tudo fica ainda melhor. Não terá de usar bengala, nem colar cervical, nem ponte de safena. Muito menos pintar o cabelo, como pinta o Jorge.
DAVID COIMBRA
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