17
de novembro de 2013 | N° 17617
MARTHA
MEDEIROS
As vantagens da solidão
Sozinha
para sempre, nem pensar. Mas há que se valorizar as vantagens de se passar um
tempo desacompanhada. A solidão não será um bicho de sete cabeças se você tiver
bom humor e souber se divertir com o momento de entressafra.
Por
exemplo, sozinha você não mente, não finge, não se faz de sonsa. Ninguém é mais
autêntico do que um solitário. Não precisa fazer de conta que está gostando da
conversa, não precisa inventar desculpas para ir embora, não precisa dizer que
está tudo bem quando está tudo bem nada.
Sozinha
você não comete gafes. Não esquece o nome da tia do seu marido, não confunde o
sobrepeso da prima dele com gravidez, não pergunta pela mãe do melhor amigo
dele. Não te contaram? Está presa por assalto a mão armada.
Sozinha
você não dá vexame por ter bebido demais, você não ameaça tirar a roupa no
final da festa, não se insinua para o namorado da filha dos outros. Sozinha você
provavelmente ficou em casa no sábado e não termina a noite sendo o trending
topic do twitter.
E não
bate-boca, não faz fofoca, não fala alto demais, não provoca ninguém. Sozinha
você é perfeita.
Já que
um jantarzinho a dois está fora de cogitação, não julgará a maneira como seu
amado maneja os talheres, o jeito que ele dança, quanto deixa de gorjeta, a miséria
do seu vocabulário, aquela insistência dele em cortar o cabelo numa espelunca
do centro. Quantas vezes a gente se arrepende por ter aberto a boca demais? Por
ter se intrometido onde não devia? Sozinha, você é uma lady.
Sem
relação estável com ninguém, você não cobra fidelidade, não reclama da bagunça,
não faz perguntas repetitivas e indiscretas. E ao viajar só, longe das manias
de um acompanhante, você não faz a louca diante de uma roubada, não inventa
desculpas para fugir de uma indiada, não ameaça fazer as malas e voltar sozinha
– já está sozinha mesmo.
Você
praticamente fica sem o que contar para o padre no confessionário. Você não
peca. Acabou-se a fama de chegar sempre atrasada. Ou de ser pontual demais. Ou
de furar encontros. Você não chega nem sai, você está fora do circuito.
Sozinha
você economiza batom, lingerie, depilação, cabeleireiro, academia. Em compensação,
gasta demais em croissants, biscoito recheado, bombons de licor. Quem é que vai
se importar se você engordar dois ou três quilos?
Sozinha
você é a maluca que dança no meio da sala, a demente que fala com as plantas, a
artista que canta alto no chuveiro, a crente que faz pedidos para a primeira
estrela que surge no céu. Você pede o quê, mesmo? Que essa solidão abençoada não
seja vitalícia: que dure no máximo até o fim de novembro. Deus a livre de não
ter em quem dar um beijo no Réveillon.
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