20
de novembro de 2013 | N° 17620
MARTHA
MEDEIROS
A grandiloquência
A
melodia do nosso Hino Nacional é muito bonita, mas a letra ainda me constrange,
como tudo o que é grandiloquente: não me acostumo com tanta retumbância,
margens plácidas, raios fúlgidos, impávido colosso. Aos primeiros acordes, me
levanto respeitosamente onde quer que esteja e até cantarolo se estiver num dia
de bom humor, mas, internamente, suplico: “Menos, menos...”.
Não
porque me falte ufanismo – na verdade, falta, mas não é essa a questão. É que
fico envergonhada diante de situações, eventos e principalmente de pessoas que
levam tudo tão a sério. É muita pompa para pouca circunstância. A vaidade
excessiva é a maior inimiga do homem, mas muitos flertam com ela sem se darem
conta do ridículo.
O
poeta Fernando Pessoa declarou que toda carta de amor é ridícula porque, claro,
os apaixonados são grandiloquentes. A grandiloquência é inerente ao amor, no
entanto, o amor só é ridículo quando se trata da paixão dos outros – se o amor
for por nós, nunca parecerá um vexame.
A
arte também abusa da grandiloquência porque é da sua natureza transcender. Alguns
pintores são grandiloquentes, a música clássica é grandiloquente, e até mesmo
canções pop se valem, de vez em quando, de um certo tom triunfal quando desejam
causar efeito, caso do Queen ao gravar Somebody to Love e outras canções com
coro e arranjos épicos, e a exemplo também de We Are the Champions, a escolhida
para toda cerimônia de formatura – garantia de lágrimas dos familiares na
plateia.
O U2
também simpatiza com a grandiloquência, tanto que chamou Pavarotti para fazer
parceria na bonita Miss Sarajevo.
E o
que dizer de Another Brick ih the Wall, do Pink Floyd? Diante de tanta potência,
a bossa nova pia fino, ela que é tão sussurrante e reservada.
Porém,
fora do showbiz, dos palcos, das óperas e dos museus, a grandiloquência é forte
candidata a cafonice. Estão aí os discursos intermináveis, cheios de retórica e
ignorando a plateia bocejante.
O
uso de joias e maquiagem em quantidade abusiva, caracterizando as peruas alérgicas
a batas de algodão e chinelinhos de dedo. As casas decoradas como se fossem
castelos da imperatriz Sissi. As limusines pretas e, pior, brancas! – a não ser
para fazer farra com os amigos num dia específico e olhe lá. Brigas escandalosas
de casais em lugares públicos. Qualquer escândalo, aliás.
Grandeza
e grandiloquência não são parentes, nem mesmo primos em terceiro grau. O DNA de
um não tem nada a ver com o DNA do outro. Apenas os nomes são parecidos. Um é João,
o outro é Jonathan.
Grandiloquência
é parente, isso sim, da inconsistência. O excesso que confirma que algo está faltando.
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