26 de novembro de 2013 | N° 17626
LUIZ PAULO VASCONCELLOS
Que
país é esse?
Antigamente, tudo era em francês: sutiã, echarpe, batom,
limusine, concierge, tudo corretamente escrito no original – soutien, echarpe,
bâton, limousine, concièrge. Hoje, é tudo em inglês: happy hour, talk show,
pocket book, shopping center, tablet, designer, workshop, on line, black bloc,
tudo escrito no mais rigoroso original. O conjunto de termos peculiares à
música continua sendo em rigorosíssimo italiano: ma non troppo, com fuoco, da
capo, larghetto, vivace, presto – e nem meu querido colega Celso Loureiro
Chaves soube me explicar por quê. No universo da gastronomia continuamos a
comer fillet, pizza, roast beef, brioche, croquette, camembert, waffle e
crouton, tudo temperado com bacon, ketchup e chantilly, terminando com um
delicioso capuccino.
Nesta semana, uma notícia sobre uma banda mineira divulgava
o nome do novo espetáculo – Funky Funky Boom Boom, e o nome das músicas, cujos
ritmos incluíam black music, pop e rock, eram: Reggae Town, Waiting for You,
Shine On, Party On e Prety Baby.
A adolescente que se suicidou por ter uma foto publicada nas
redes sociais sofreu o quê? Cyberbullying. O ex-presidente Fernando Collor foi
afastado da presidência da república depois do quê? Impeachment. Uma reunião de
empresas é o quê? Um pool. O triatleta Sergio Lopes, que disputou a Maratona do
Gelo na Antártica, sofreu o quê? Frost Bite. E assim por diante.
Na área do teatro não são muitos os estrangeirismos, mas
ainda prevalecem alguns: borderô, cachê, clichê, matinê, mise en scène,
performance, e o mais maravilhoso de todos, apesar de quase impronunciável –
verfremdungseffekt, traduzido por “distanciamento”, termo usado para designar o
conceito central do Teatro Épico formulado por Bertolt Brecht na primeira
metade do século passado.
A tradução mais aproximada de verfremdungseffekt é
“estranhamento”, consistindo numa revisão de fatos ou atitudes que, de tão
familiarizado, o espectador já perdeu qualquer perspectiva crítica. Nas
palavras do próprio Brecht, “trata-se de uma técnica que permite retratar
acontecimentos sociais de maneira a serem considerados insólitos, necessitando
de explicação. A finalidade deste efeito é fornecer ao espectador a
possibilidade de exercer uma crítica construtiva”. Do que, aliás, estamos
necessitando em termos do insólito idioma que falamos. Portanto,
verfremdungseffekt pra todos nós.
E para responder à pergunta do título da coluna, encerro com
uma frase do grande Darcy Ribeiro: “O brasilíndio como o afrobrasileiro
existiam numa terra de ninguém, etnicamente falando, e é a partir dessa
carência essencial, para livrar-se da ninguendade de não-índios, não-europeus e
não-negros que eles se veem forçados a criar sua própria identidade étnica: a
brasileira”.
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