terça-feira, 1 de março de 2022


01 DE MARÇO DE 2022
NÍLSON SOUZA

Lobos e cordeiros

No preâmbulo de seu livro A História da Raça Humana através da Biografia, o historiador Henry Thomas divide os personagens reais de seu ensaio em duas categorias: a dos que procuram melhorar a civilização e a dos que a retardam. Os primeiros são os pacifistas, os segundos são os provocadores de guerras.

Ele publicou a sua obra em 1938, antes da Segunda Guerra Mundial, com biografias de profetas, guerreiros, filósofos, cientistas e políticos - lideranças reconhecidas que influenciaram povos e nações para o bem e para o mal. Nessa original recapitulação da caminhada da humanidade sobre o planeta, o escritor chega a uma conclusão: a guerra não é só uma carnificina, é também um suicídio. Segundo seu levantamento, todas as nações agressivas da História acabaram por matar a si próprias, juntamente com seus inimigos.

- Levamos 10 mil anos trágicos para alcançar o grau atual da civilização. Num mundo isento de guerras, teríamos chegado ao mesmo resultado em 500 anos - estimou o historiador.

No momento em que a humanidade recua mais algumas casas no tabuleiro da civilização por conta da invasão russa à Ucrânia, a releitura dessas biografias ilustres nos mostra que nem os tiranos mais astuciosos escapam do julgamento da História. É verdade que nem todos acabam pendurados pelos pés, como pareceria mais justo para os seus contemporâneos, mas cedo ou tarde eles recebem o devido castigo por seus crimes e maldades, ainda que seja apenas a execração póstuma. Antes, infelizmente, costumam causar dor e sofrimento não só aos que perseguem e oprimem como também ao próprio povo.

Só a democracia previne e corrige essa monstruosa deformação do poder, desde que seus valores primordiais sejam efetivamente observados: eleições livres e idôneas, liberdade de expressão, alternância, livre acesso à informação, transparência, instituições sólidas e representatividade de minorias. Não é por outro motivo que candidatos à tirania atacam e tentam desconstituir tais princípios, invariavelmente com pretextos tão cínicos como aqueles apontados por La Fontaine na célebre fábula do lobo e do cordeiro.

Identificar potenciais autocratas é essencial para preservarmos o nosso direito de escolher lideranças que ao menos nos permitam viver em paz.

NÍLSON SOUZA

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