quinta-feira, 22 de julho de 2010


CLÓVIS ROSSI

O risco do fiscal da esquina

SÃO PAULO - Duas coisas incomodam muito nesse episódio da violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge Caldas Pereira, o vice-presidente do PSDB. Uma é a óbvia: a inescapável sensação de que funcionários do Estado sentem-se à vontade para agir sordidamente.

Afinal, ninguém vai conseguir convencer ninguém, salvo os petistas hidrófobos, de que o acesso aos dados se deu por mera curiosidade ou para que a funcionária agora exposta os exibisse para a família. O objetivo, evidente, foi o de lançar sujeira na campanha eleitoral.

Objetivo, de resto, atingido, independentemente do que venha a acontecer com a funcionária: os dados tornaram-se públicos e a única coisa que a vítima da violência do Estado pode fazer é reclamar, protestar, denunciar.

O segundo incômodo está dado pela constatação de que qualquer um pode acessar dados sigilosos sob guarda do Estado.

Afinal, a investigação aberta pela própria Receita descobriu que foram feitos ao menos cinco acessos ao imposto de renda de Eduardo Jorge, mas apenas a consulta atribuída à funcionária agora afastada ocorreu sem "motivação", ou seja, fora de procedimentos de rotina do fisco e sem autorização judicial.

Primeiro: autorização judicial deveria ser a única maneira de a Receita ter acesso a dados de quem quer que seja. Aceitar que a violação faça parte de "procedimentos de rotina do fisco" é abrir uma autoestrada imensa para todo tipo de criminalidade, eleitoral ou de qualquer outra natureza.

Não dá para acreditar que todos os agentes fiscais sejam imunes à tentações, sejam os mais honestos seres humanos na face da Terra. Não existe um único conjunto humano com essas características.

Vale nesse caso o que se diz de ditaduras: o problema é menos o general que a chefia e mais a arbitrariedade do guarda da esquina. Ou, no caso, do fiscal da esquina.

crossi@uol.com.br

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