quinta-feira, 15 de julho de 2010



15 de julho de 2010 | N° 16397
PAULO SANT’ANA


Vendo estrelas

Olhem o que disse o bispo Desmond Tutu, ás do antiapartheid ao lado de Mandela, sobre a realização da Copa do Mundo na África do Sul: “Alguns dirão que foi uma loucura tanto dinheiro em estádios e sistemas de transporte. Mas as pessoas não vivem só de pão. Tiveram a sensação de que podiam tocar as estrelas, e isso não tem preço”.

Perfeito, bispo Tutu. Aqui no Brasil, com esta Copa bilionária que vamos organizar, as pessoas não vão tocar nas estrelas, e sim ver estrelas na angustiante fila da cirurgia do SUS.

Vão ver estrelas de tanta dor.

Se um bispo da dimensão do Tutu, declara que o povo não vive só de pão, vive também de Copa, eu deveria desistir.

Mas não desisto.

Aos que alegam que os melhoramentos que serão feitos no Brasil pela Copa do Mundo transcenderão cronologicamente à sua realização, então sugiro que sediemos todas as Copas do Mundo daqui por diante, só no Brasil.

E teremos então todos os nossos problemas sociais e econômicos resolvidos, não teremos mais doentes na fila das consultas e cirurgias, realizemos mais uma outra Copa do Mundo e estará resolvido o nosso problema de segurança pública, realizemos mais uma outra Copa e teremos esgotos em 100% das nossas habitações brasileiras, em vez dos 35% atuais, todos os nossos problemas estarão resolvidos.

E dá-lhe Copa do Mundo e Olimpíada em cima do povo brasileiro.

No caso da realização da Copa do Mundo em Porto Alegre, chega a causar compaixão: os gaúchos e os brasileiros simplesmente não verão sequer um jogo do Brasil, entre os três que serão realizados em nossa Capital.

Que vantagem é essa que teremos em financiar a Copa do Mundo em Porto Alegre se só poderemos assistir a Argélia x Camarões ou Bulgária x Nigéria no Beira-Rio?

Nem iremos lá, nem temos sequer R$ 1 mil para pagar por um ingresso para jogos que poderemos ver de graça na televisão.

Incrivelmente já está decidido que o jogo de abertura da Copa do Mundo será em São Paulo, quando também se sabe que o Morumbi está vetado. Teremos então que construir um estádio em São Paulo, com recursos públicos, R$ 700 milhões até R$ 1 bilhão, com certeza.

Mas isto é dinheiro público posto fora.

Todas as obras estão atrasadas, como estão atrasadas todas as obras públicas necessárias e urgentes sem Copa do Mundo.

Mas que desmando! Mas que loucura!

Não tem, como me disse cordialmente o prefeito José Fortunati, dinheiro público para construir o viaduto da Nilo Peçanha com Carazinho, obra vital para a Zona Leste e para a cidade, que está engarrafando numa agonia lenta.

Mas dinheiro para esnobar com uma Copa do Mundo teremos.

Não temos presídios e não temos hospitais, pelo que faltam dramaticamente vagas nos presídios e nos hospitais.

Mas que diabo de projeto é esse que visa a construir estádios e estacionamentos em estádios e esquece de que precisamos urgentemente construir presídios, hospitais e escolas?

É inevitável, vai acontecer o grande desastre, serão realizadas a Copa do Mundo e a Olimpíada no Brasil.

Mas isto não impede que sejamos contra.

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