05 DE JUNHO DE 2020
PORTO ALEGRE
Marchezan quer criar pedágio no Centro
Ideia do prefeito é destinar verba para viabilizar o transporte público
Em poucos dias, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre deve receber novo pacote do governo Nelson Marchezan de enfrentamento aos problemas causados pela covid-19. Entre medidas que abrangem da assistência social à saúde, está uma proposta de geração de receita para o transporte público, que perdeu cerca de 70% dos passageiros ao longo da pandemia. O subsídio viria de uma tarifa para a circulação de carros pelo Centro Histórico.
A ideia é uma reformulação do projeto apresentado em janeiro, que instituiria pedágio para ingresso de carros de outros municípios na cidade e ainda não foi apreciado pela Câmara. À época, uma das críticas da proposta era de discriminar motoristas de fora da Capital, e uma das sugestões era transformá-lo em tarifa específica para regiões congestionadas.
Embora a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) não tenha detalhado o projeto após o anúncio do prefeito, a ideia, ao menos em tese, é vista com simpatia por especialistas em transportes, que veem nela uma forma de "taxação de externalidades negativas" pelo uso do carro. Ou seja, uma maneira de tributar os motoristas pelos males que o veículo causa à cidade e a seus habitantes.
- O carro gera congestionamento, má-qualidade do ar que ataca a todos os órgãos humanos. Faz todo sentido cobrar as externalidades do automóvel, especialmente em contexto em que o transporte público precisa de fontes de financiamento para sobreviver - declara Luiz Antonio Lindau, diretor do programa de cidades do WRI no Brasil.
Lindau atenta ainda para o uso do termo "pedágio urbano", no seu entendimento uma má-tradução e exemplo de como a questão é tratada equivocadamente no Brasil. Em lugares que aplicaram medidas semelhantes, ela é tratada como "taxa de congestionamento", para que os motoristas não se sintam onerados, mas sim respondendo a um problema em tempo real.
Referências
Não há exemplos de medidas semelhantes em países em desenvolvimento. As referências vêm da Inglaterra, Suécia e Singapura - país em que o sistema é aprimorado desde a década de 1970 e hoje funciona de forma invisível, com tarifas dinâmicas à semelhança de uma corrida por aplicativo.
Para Clarisse Linke, diretora- executiva da ONG Instituto de Políticas de Transportes e Desenvolvimento, a não aplicação em países como o Brasil se dá por falta de vontade política, e ela elogia o pioneirismo de Porto Alegre na discussão. Porém, atenta para problemas da aplicação da medida:
- É preciso cuidado para que isso não gere alguns oásis pela cidade enquanto as periferias se tornam ainda mais degradadas, poluídas e congestionadas.
Embora simpático à medida como alternativa para redução de congestionamentos, o urbanista Anthony Ling faz ressalvas à simples transferência desses recursos para empresas concessionárias do sistema de ônibus:
- Vejo (o pedágio) como forma de utilizar melhor os espaços da cidade e de arrecadação como qualquer outra. Mas quando se fala em gestão, é sempre um problema ter verbas carimbadas. E anunciar que essa verba iria diretamente para as empresas que têm histórico de problemas, de deficiências, talvez possa pegar mal.
De qualquer forma, o problema do transporte público clama por soluções. Em alusão à pandemia da covid-19, Lindau dá o tom da urgência:
- Dizem que o século 21 começou de verdade neste ano. Diante de um problema novo, precisamos de soluções novas. Já será uma vitória se o transporte público sobreviver.
Nenhum comentário:
Postar um comentário