terça-feira, 16 de junho de 2020



16 DE JUNHO DE 2020

NÍLSON SOUZA

Continhos juninos

O jovem atravessa a avenida movimentada, consultando o celular e com fones nos ouvidos. Ruído de freada, uma batida seca e, na cena seguinte, o sujeito aparece diante de São Pedro, ainda com o celular na mão:

- Seja bem-vindo, meu filho! - diz o santo bonachão. O rapaz tira o fone de uma orelha, olha para o velho de cima a baixo e pergunta:

- Tem wi-fi aí, coroa?

Em tempos de quarentena e festas juninas, a criativa professora se esforça para captar a atenção das crianças na aula online. Inventa uma caça ao tesouro, sugerindo objetos que podem ser encontrados em casa. Mostra uma imagem e dá um tempo para que a garotada se apresente diante da câmera com algo semelhante.

O objeto da vez é um quadro de parede, em que aparece uma senhora de cabelos brancos sentada na sua cadeira de balanço.

Hora de conferir os achados: Pedro Lucas entra em cena puxando a avó pelo pijama.

Tio João, quem não tem ou teve um? Tive dois, que também já se apresentaram a São Pedro e certamente ganharam lugares de honra na ala dos bem-aventurados. Ambos eram mesmo chegados a aventuras.

Um deles, homem da roça, gabava-se de sua pontaria nas caçadas, até que numa festa junina os moleques da família apareceram com uma espingarda de pressão e desmoralizaram o tiozinho. Colocavam uma lata a 10 metros e entregavam a arma já engatilhada para ele, mas sem a munição. Ele mirava com cuidado, atirava, ouvia o estampido e nada acontecia. Ficou arrasado:

- Acho que estou ficando cego - dizia, esfregando os olhos.

O outro era um trapalhão assumido e se divertia contando as histórias de suas trapalhadas. Essa eu ouvi dezenas de vezes: numa festa de casamento num sítio do interior do Estado, alguém soltou um rojão e assustou um porco, que se enfiou exatamente entre as pernas desse tio azarado, arrastando-o pelo meio dos convidados até descarregá-lo numa poça de lama. Se non è vero, è ben trovato.

Não sei se minhas historinhas que misturam fantasia e realidade passariam no vestibular da colega Cíntia Moscovich, que inicia nesta semana a sua Oficina de Pequeníssimas Narrativas. Mas é melhor do que escrever sobre os tormentos do momento, não é mesmo?

NÍLSON SOUZA

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