11 DE JUNHO DE 2020
ARTIGOS
QUEM CUIDA DO CUIDADOR?
Entre emoções acirradas, o ato de cuidar não pode parar. Os profissionais da saúde encontram-se nesse lugar de cuidado frente à covid-19. Nesse contexto, muitas mortes serão evitadas, mas muitas serão inevitáveis. Entre perdas e lutos não reconhecidos, o trabalho continua enquanto a outra vida se esvai. A morte, antes subtraída diante de uma rotina marcada pelos inúmeros procedimentos que necessitam ser realizados, agora se escancara pela pandemia.
Não é suficiente reconhecer os atributos e habilidades dos profissionais frente ao processo de morte e morrer como se este fosse apenas racional e consciente. É necessário levar-se em consideração as dificuldades individuais e coletivas, os sentimentos, as situações pessoais e interpessoais, a satisfação/insatisfação dos profissionais, e a necessidade de fortalecimento pessoal.
Ainda, é necessário um SUS que apresente toda a sua potência de assistência à saúde e responda efetivamente à demanda. No entanto, um dos maiores, mais complexos e mais completos sistemas de saúde pública do mundo foi submergindo à falta de investimento. A EC 95, congelando os recursos à saúde, precarizou e sucateou o SUS, sua assistência e seus trabalhadores.
Conforme a Constituição Federal de 1988 a "saúde é direito de todos e dever do Estado". Todavia, a saúde vem sendo enforcada com repasses limitados enquanto a demanda aumenta, não permitindo que todos recebam a assistência de que precisam. E a pandemia apenas vem mostrar que a saúde deveria estar nos primeiros lugares de investimento governamental. Na situação pandêmica, as pessoas não estão morrendo somente pelo coronavírus. Morrem pela falta de investimentos, pela precarização e pela discrepância social.
Quando há contingenciamento de recursos para a saúde, de certa forma, já está lançada a possibilidade de escolher os que vão viver e os que vão morrer. O adoecer e o morrer são distintos, mas se igualam quando a falta de recurso não permite o cuidado. Quem enfrenta e enfrentará essa situação de perto são os profissionais da saúde. Será inevitável fazer a "escolha de Sofia". E a saúde mental dos profissionais fica sujeita e sujeitada pelas exigências do trabalho. Quem cuida do cuidador?
DANIELA TREVISAN MONTEIRO, PSICÓLOGA, DOUTORA EM PSICOLOGIA SOCIAL E INSTITUCIONAL
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