14
de novembro de 2013 | N° 17614
L.F. VERISSIMO
Camus ou
Cami
Me
lembro do meu pai treinando seu francês para o discurso que faria em saudação
ao Albert Camus, que estava no Brasil e visitaria Porto Alegre. Era “Camus”,
com final “mus” como em “músculo”, ou “Cami”? Eu só sabia que era um francês
importante. Depois ele falou mal da sua visita. Nunca ficou claro o que lhe
desagradara tanto no Brasil. Seu desgosto foi com todo o país, não só com Porto
Alegre. O que pelo menos livrou a pronúncia do meu pai.
Antes
de ler qualquer coisa do Camus, eu já sabia da vida dele, instigado por aquela
sua visita à minha cidade quando eu tinha 13 anos. Sua infância na Argélia, sua
atuação na resistência durante a ocupação nazista da França, e – o que mais me
interessava – o fato de ele ter sido goleiro na juventude. Mais tarde, quando
comecei a ler sua obra, me interessei pelo mito inteiro.
Sua
definição do absurdo da existência na figura de Sísifo, sua posição ambígua
diante da guerra de independência da Argélia, seus desentendimentos com Sartre,
seu prêmio Nobel (que Sartre também ganhou mas se recusou a receber) e sua
crescente reputação entre os intelectuais da época como alternativa para o
engajamento radical do Sartre, e entre as leitoras da época como a
personificação do escritor enquanto galã.
Este
ano comemora-se o centenário do nascimento de Camus, cujo nome e cuja
influência, acho eu, duraram mais do que as do Sartre. O dele ainda é um modelo
de engajamento a ser seguido. Numa entrevista publicada na Les Nouvelles
Litteraires, em 1951, ele qualifica a conclusão, representada no mito de Sísifo
e o eterno retorno da sua pedra, que a condição humana é um absurdo
inescapável.
Diz
Camus: “Nada realmente tem sentido? Nunca acreditei nisso. Enquanto escrevia O
Mito de Sísifo, eu já pensava no ensaio sobre a revolta que escreveria em
seguida”. O ensaio citado pelo autor é o livro O Homem Revoltado, uma receita
para que a vida faça sentido, na revolta contra a injustiça.
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