terça-feira, 12 de novembro de 2013


12 de novembro de 2013 | N° 17612
LUIZ PAULO VASCONCELLOS

Para que serve a crítica?

Primeira possibilidade: eu não paro no cruzamento com uma velhinha com a mãozinha estendida. Segunda possibilidade: eu paro no cruzamento, e o carro de trás bate no meu. Em ambos os casos é fundamental uma avaliação crítica, alguns minutos de questionamento analisando o procedimento adotado e suas consequências. Isso é o que possibilita mudanças no comportamento, na conduta, na atitude.

Se não encontro tempo para ruminar sobre o acontecido, se não dou bola para o acontecido, continuarei não parando no cruzamento ou parando e levando porrada na traseira do carro. Assim, também, na arte. Uma arte sem crítica é uma arte à deriva, inerte, solta no ar, sem referenciais, sem um termômetro para medir a febre ou uma balança para te chamar de gordo.

No teatro existem três tipos de críticas. A do bar, após o espetáculo, quando a cerveja relaxa as tensões e se solta o verbo expondo com ironia tudo o que acabamos de ver. A da academia, resultante das dissertações de mestrado e das teses de doutorado, escritas em linguagem culta, a maioria das vezes num jargão incompreensível, e que depois ficam lá ocupando espaço e juntando pó nas estantes das bibliotecas. E a jornalística, em linguagem acessível, analisando, comparando, contrastando, definindo princípios, estéticas, gêneros e estilos. Esse tipo de crítica – pelo menos com relação ao teatro – infelizmente deixou de existir. Ou quase.

Que a crítica é essencial à arte nem dono de jornal duvida. Crítica é memória, debate, discussão, polêmica. Troca, argumentação, diálogo. O crítico é aquele que percebe e proclama o novo ao mesmo tempo em que fareja e revela a incompetência. Uma arte sem críticos está sempre ameaçada por perigos avassaladores, mediocridade, ganância, sucesso fácil, estrelismo, fórmulas prontas, modismos e um sem número de circunstâncias que estacionam na periferia da criação e determinam os modelos a serem consumidos.

E a função do crítico se amplia na medida em que o palco é um espaço de contextualização do texto. Ainda mais em tempos de indefinição de fronteiras entre os meios expressivos, teatro, dança, vídeo, performances, instalações e o diabo a quatro. Ainda mais diante da dissolução anárquica das formas. Ainda mais diante da ação imperialista do modelo televisivo brasileiro.


É aí então que entra o crítico, o bom crítico, aquele que tem formulado para si o que a arte é e deveria ser, muito embora não hesite nunca em colocar em dúvida essa fórmula cada vez que se confronta com algo novo na sequência dos acontecimentos teatrais.

Nenhum comentário: