sexta-feira, 8 de agosto de 2025


08 de Agosto de 2025
EM FOCO

EM FOCO

Oposição fala em acordo para pautar anistia; Motta nega. Após encerrar a ocupação das mesas diretoras do Congresso, parlamentares tentam fazer avançar um pacote de propostas que inclui alteração na regra do foro privilegiado e uma PEC que dificulta a prisão de deputados e senadores. Ex-presidente Arthur Lira está à frente das negociações

Após encerrar a obstrução das votações na Câmara e no Senado, parlamentares de oposição alegam ter obtido acordos para colocar em pauta o projeto de lei que concede perdão aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), porém, negou.

A mobilização de oposicionistas no Congresso se iniciou na terça-feira, um dia após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decretar a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro na segunda-feira. Os parlamentares ocuparam as mesas diretoras das duas Casas, impedindo os trabalhos.

No Senado, o movimento se estendeu por 47 horas e só foi encerrado no fim da manhã de ontem. Senadores chegaram a se acorrentar no plenário.

A retirada ocorreu após negociação com o presidente Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). O líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), disse que o recuo foi um gesto para o "restabelecimento da normalidade".

Na Câmara, Motta retomou a cadeira no fim da noite de quarta-feira sob forte tensão. A polícia legislativa chegou a ser posicionada na porta do plenário, e Motta havia ameaçado suspender os mandatos dos envolvidos.

Ontem, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que existe um acordo para pautar a anistia ao 8/1:

- A gente não está aqui defendendo que há um acordo para aprovar a anistia, a gente está defendendo que há um acordo para que se paute a anistia, tanto na Câmara quanto no Senado. E quem tiver maioria vai levar essa.

Segundo o jornal O Globo, as conversas envolveram parlamentares de PL, Novo, União Brasil, PP e PSD, com mediação do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), e sem a participação de Motta.

Além da anistia - cujas chances são consideradas pequenas -, os oposicionistas esperam conseguir emplacar outras propostas, incluindo uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que dificulta prisão de deputados e senadores e mudanças na regra do foro privilegiado (leia ao lado).

Punição em análise

Ao chegar ao Congresso ontem, Motta negou que tenha garantido qualquer contrapartida para convencer a oposição a encerrar a ocupação.

- A presidência da Câmara é inegociável. Quero que isso fique bem claro. A negociação feita para que os trabalhos fossem retomados não está vinculada a nenhuma pauta - disse.

Mais tarde, Motta ainda afirmou, em entrevista ao portal Metrópoles, que está em análise uma punição aos colegas que participaram da obstrução.

- Estamos avaliando as imagens. Existem alguns pedidos de lideranças para punir esse ou aquele deputado que se excedeu - alegou. _

"O presidente da Câmara não negocia prerrogativa com oposição, governo, ninguém."

Hugo Motta - Presidente da Câmara

Também ontem, o ministro Alexandre de Moraes autorizou Bolsonaro a receber visitas de aliados. O primeiro foi o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que esteve com o ex-presidente à tarde.

No ofício em que pediu liberação para visitar Bolsonaro, Tarcísio disse ser "correligionário e amigo" do ex-presidente e alegou "razões humanitárias".

Moraes também autorizou outros cinco aliados de Bolsonaro a visitá-lo nos próximos dias, incluindo dois gaúchos, Luciano Zucco (PL) e Marcelo Moraes (PL). Hoje, será a vez da vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão.

Pelo menos outros cinco parlamentares já pediram para visitar, mas até ontem não havia decisão do ministro.

Em uma sessão relâmpago, que durou cerca de 20 minutos, após a desobstrução da Mesa Diretora, o Senado aprovou o projeto de lei que amplia a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até dois salários mínimos por mês. A matéria agora segue para sanção presidencial.

A faixa de isenção foi elevada de R$ 2.259,20 para R$ 2.428,80 por uma medida provisória (MP). Na prática, contribuintes com renda até R$ 3.036 (equivalente a dois mínimos) ficam isentos, porque se soma ao desconto simplificado de R$ 607,20.

O projeto de lei foi aprovado em junho pela Câmara e precisava passar pelo Senado até o dia 11, quando a MP perde validade.

A votação ocorreu de forma simbólica. O governo agora espera conseguir aprovar o projeto que amplia a isenção para quem ganha até R$ 5 mil.

A proposta já foi aprovada por uma comissão especial da Câmara e agora aguarda votação no plenário.

Já na Câmara, a primeira proposta aprovada após a desocupação da Mesa foi a MP que cria um pagamento extra a servidores do INSS para revisão de benefícios assistenciais e previdenciários pagos aos trabalhadores.

O objetivo é reduzir a fila para concessão e revisão de pensões, auxílios-doença e aposentadorias por incapacidade, entre outros. O assunto segue agora para o Senado.

A MP prevê pagamentos como incentivo por produtividade de R$ 68 por processo para servidores do INSS, e outro de R$ 75 por perícia ou análise para servidores da perícia médica. O programa terá duração até 15 de abril de 2026, podendo ser prorrogado até 31 de dezembro do próximo ano.

A relatora da MP na comissão mista, senadora Zenaide Maia (PSD-RN), lembrou que a fila de reavaliação de benefícios ultrapassa 2 milhões de processos.

Embaixada dos EUA volta a criticar Moraes; Eduardo diz que buscará sanções na Europa

A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil voltou a criticar o ministro Alexandre de Moraes. Em publicação em rede social, a representação norte- americana no Brasil afirmou que o magistrado é "o principal arquiteto da censura e perseguição" contra Bolsonaro.

A postagem é uma tradução de uma manifestação anterior do subsecretário para Diplomacia Pública da Secretaria de Estado dos EUA, Darren Beattie, assessor do secretário Marco Rubio. O órgão é equivalente ao Ministério das Relações Exteriores.

"O ministro Moraes é o principal arquiteto da censura e perseguição contra Bolsonaro e seus apoiadores. Suas flagrantes violações de direitos humanos resultaram em sanções pela Lei Magnitsky, determinadas pelo presidente Trump", inicia a mensagem.

Sem citar outros nomes, o texto faz um alerta em tom de ameaça aos demais ministros do STF.

"Os aliados de Moraes no Judiciário e em outras esferas estão avisados para não apoiar nem facilitar a conduta de Moraes. Estamos monitorando a situação de perto", encerra a mensagem.

A Lei Magnitsky, que foi aplicada a Moraes, impede o ministro de entrar no país, bem como de movimentar bens e de ter acesso a serviços de empresas norte-americanas. É a primeira vez que um juiz de suprema corte é enquadrado na legislação, que costuma ser usada para punir ditadores e terroristas.

Além de Moraes, outros sete ministros do Supremo também tiveram os vistos americanos cassados por decisão da Casa Branca.

Esta semana, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL- SP) afirmou, em entrevista ao portal Metrópoles, que planeja incursão à Europa com o objetivo de aumentar a pressão internacional sobre Moraes.

- Pretendo viajar à Europa, ir ao Parlamento Europeu. Já tenho um convite feito pelo parlamentar polonês. Só tenho de me assegurar que não serei mais uma vítima do Moraes e fazer as gestões para descobrir se a Interpol está ou não pedindo a minha prisão - disse.

Além da Polônia, a intenção é percorrer países como Portugal, Espanha, Itália, Bélgica e Hungria, buscando sanções semelhantes às aplicadas pelos EUA. A viagem pode ocorrer entre setembro e outubro.

Eduardo se transferiu para os EUA em fevereiro e é apontado como um dos principais responsáveis tanto pelas sanções contra Moraes quanto pelo tarifaço aplicado pela Casa Branca às importações brasileiras (leia mais na página 7). _

Pressão sobre Alcolumbre cresce, mas possibilidade de impeachment é remota

Humberto Trezzi

Matheus Schuch - matheus.schuch@rdgaucha.com.br

Após a liberação do plenário do Senado ontem pela manhã, parlamentares de oposição anunciaram ter reunido 41 assinaturas para pedir a abertura de um processo de impeachment de Alexandre de Moraes. O apoio da maioria dos 81 senadores aumenta a pressão sobre o presidente Davi Alcolumbre, mas não garante a abertura da investigação.

Antes de Moraes decretar a prisão domiciliar de Bolsonaro, a lista contava com 36 assinaturas. Outros senadores decidiram aderir por entenderem que houve abusos na decisão.

Caso seja confirmado, será a primeira vez no Brasil que um ministro do STF enfrenta um processo de impeachment. São necessários 54 votos no Senado (dois terços do total de senadores) para Moraes perder, de fato, o cargo.

Para ocorrer o impeachment, no entanto, é necessário apontar um crime de responsabilidade praticado por Moraes. Juristas ouvidos por Zero Hora consideram pouco provável que a ideia ganhe corpo.

A oposição acredita que pode embasar um pedido de impeachment sob alegação de que Moraes participa de um julgamento no qual, por lei, estaria impedido por suspeição. Isso ocorre quando um ministro ou juiz tem algum tipo de vínculo com o tema ou com as partes envolvidas no processo.

O entendimento dos oposicionistas é de que o magistrado não poderia julgar Bolsonaro e outros participantes da suposta tentativa de golpe após a eleição de 2022. Isso porque, segundo a investigação, o plano de golpe previa a prisão e até o assassinato de Moraes.

O professor de Direito e advogado criminalista Pierpaolo Bottini, que atuou na defesa de acusados pela Operação Lava- Jato, considera que essa suspeição tem escassa chance de prosperar:

- Não tem o menor fundamento. Trata-se de ato jurisdicional, e a competência do ministro para julgar o caso foi reconhecida pelo próprio colegiado do STF. Ainda que seja uma apreciação política no Senado, há uma premissa que deve ser respeitada: deve existir o crime de responsabilidade.

Um dos argumentos é que Moraes foi escolhido relator antes de ser descoberto o suposto plano para matá-lo.

Imparcialidade

Por outro lado, o jurista gaúcho Lucio de Constantino, que também atuou na Operação Lava-Jato, considera que existe base teórica para um processo de impeachment porque há previsão legal no sentido de que o juiz não pode exercer jurisdição no processo em que for diretamente interessado:

- No momento em que o expediente do suposto golpe investiga ameaças de morte contra o juiz Moraes, há, sim, um manifesto impedimento jurisdicional. É que deve prevalecer a imparcialidade do julgador. _

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