sábado, 2 de maio de 2020



02 DE MAIO DE 2020
BRUNA LOMBARDI

O ENCONTRO QUE MUDOU MINHA VIDA

Lembranças de uma visita aos povos indígenas do Xingu. Desci de um pequeno avião numa pista improvisada no coração da floresta, perto do Posto Leonardo. Os irmãos Villas Boas tinham conseguido a demarcação das terras indígenas e era quase impossível visitar o Xingu.

A razão de eu aceitar esse trabalho foi justamente viver essa aventura, mas eu não podia imaginar que isso mudaria minha vida pra sempre.

Eu era a única mulher de uma pequena equipe e conheci o ator que faria o papel de Aritana, com quem eu ia passar um mês na aldeia Yawalapiti, no Alto Xingu. Era uma época ainda de muito pouco contato com os brancos e eu ia poder vivenciar o cotidiano nas ocas e a cultura da tribo.

Conhecemos o verdadeiro cacique Aritana, um líder de alma nobre, um príncipe no seu comportamento. Eles falavam o Aruak e também entendiam muitas frases nossas. Tinha uma forte curiosidade de troca dos dois lados. Era impressionante a organização serena da aldeia, a calma do tempo e a maneira como convivem com a natureza.

Íamos nadar diariamente no Rio Tuatuari e na Lagoa Ipavu, lugares de beleza indescritível, águas supercristalinas que eles bebem e nunca sujam. Tudo é muito limpo, assim como o interior da oca e o manuseio da comida. Eles plantam principalmente mandioca e pescam o necessário para o consumo. E a gente de canoa ia pescar com eles.

Eu ficava fascinada com a arte, o artesanato criativo colorido. Todos se enfeitavam numa linda mistura de cores. E a gente dançava junto com eles. Eles fizeram para nós todos os rituais, festas, lutas e cerimônias para a filmagem e o Ri, vestido de índio, participou de tudo. Você vê as cenas e quase não o reconhece.

Brincamos muito com as crianças livres, carinhosas e sempre felizes. Elas diziam "vamo banha?" e iam correndo com a gente pra mergulhar. Os índios são pessoas fortes, generosas e extraordinariamente verdadeiras.

Participamos de cerimônias com o xamã com sua absoluta sabedoria de todas as ervas e plantas da floresta. O xamã prepara as substâncias para tudo o que eles precisam. E faz as sessões de cura. Os rituais têm um espírito religioso e muitos cantos e danças.

Conhecer o Ri nesse paraíso terrestre foi um estado de total encantamento, com ele e com tudo o que me cercava. Fomos nos apaixonando na exuberante beleza e magia desse lugar. Não parecia real. Todos os dias a gente andava no meio de milhares de borboletas amarelas e azuis, numa absoluta comunhão com a natureza.

E nas noites adormecia olhando o céu do Xingu. Não encontro palavras pra descrever aquela imensidão silenciosa coberta de estrelas. Momentos de uma emoção tão profunda.

Nunca pensei que uma história de amor pudesse acontecer assim. E nem estava esperando nada disso.

Conviver com povos indígenas foi uma experiência transformadora. Uma vivência que marcou a nossa vida e trouxe à tona nosso lado índio, livre, da terra, da natureza. E foi olhando aquele horizonte que não tinha fim que descobri como podia ser infinita a dimensão do amor.

Penso no Xingu, nos povos indígenas e na nossa história e sinto profundo respeito, admiração e uma gratidão imensa.

BRUNA LOMBARDI

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