segunda-feira, 25 de maio de 2020


25 DE MAIO DE 2020
CLAUDIA LAITANO

Acordando gigantes

Preteou o olho da gateada. Sites que defendem o uso indiscriminado da cloroquina, contra todas as evidências científicas em contrário, ou minimizam os riscos de contaminação pelo coronavírus começam a sentir no bolso os efeitos da chegada ao Brasil, na semana passada, da versão nacional do movimento Sleeping Giants (algo como "gigantes adormecidos").

Criado em 2016 nos Estados Unidos pelo publicitário Matt Rivitz, o Sleeping Giants se apresenta como "um movimento para tornar o fanatismo e o sexismo menos lucrativos". O objetivo é alertar grandes marcas quando seus anúncios, randomicamente, forem parar em sites que apoiam políticos de extrema direita ou divulgam fake news e informações que contrariam a ciência. Se uma empresa não quer que seus anúncios remunerem autores de artigos que defendem o fechamento do STF ou o desmatamento da Amazônia, por exemplo, pode comunicar ao Google o desejo de que sua publicidade não mais seja veiculada nesse tipo de site. O recurso sempre existiu, mas a maioria das empresas não conhecia ou não se preocupava em usar.

Nos Estados Unidos, o Sleeping Giants já é a maior dor de cabeça de sites de extrema direita que se financiam através da chamada "publicidade programática", aquela que é distribuída sem que o anunciante saiba exatamente em que cumbuca está metendo a mão. No Brasil, o efeito foi imediato. Em poucos dias, o perfil do movimento no Twitter (@slpng-giants-pt) alcançou 100 mil seguidores, com o apoio de celebridades como Felipe Neto e Luciano Huck, e mais de 30 empresas com publicidades veiculadas em sites de fake news foram alertadas. 

Algumas dessas empresas utilizaram seus perfis no Twitter para informar que não apoiam desinformação e que iriam retirar seus anúncios desses sites - entre elas, o Banco do Brasil, que acabou voltando atrás depois que o vereador Carlos Bolsonaro se mostrou contrariado com a rasteira nas "mídias alternativas". (Alguém deve ter captado a mensagem do delfim e tratou de colocar os anúncios do banco de volta na cumbuca.)

Agora que todo mundo já sabe o estrago que as fake news podem causar nas sociedades democráticas, o desafio é desenvolver ferramentas para combatê-las que se aproveitem das mesmas tecnologias que as inflaram e alimentaram - exigindo que gigantes da tecnologia como Google, Twitter, Facebook e Amazon assumam responsabilidades e façam a sua parte. Às "mídias alternativas" apoiadas por Carlos Bolsonaro e seus amigos resta tentar sobreviver com a devida transparência, sustentadas por anunciantes e assinantes que se identificam com suas ideias e visão de mundo. Há espaço para todos quando a liberdade de expressão é um princípio e não apenas uma fachada.

CLAUDIA LAITANO

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