Elio
Gasperi
Tião Viana desovou os
haitianos
O
governador do Acre exportou os refugiados sem aviso ou cuidado e achou um bode:
a 'elite paulista'
Na
semana em que o papa Francisco canonizou José de Anchieta, o governo do Acre
completou a desova, em São Paulo, de 400 haitianos que se refugiaram no Brasil.
É um truque velho, usado até mesmo com brasileiros. Quando um prefeito incomoda-se
com a chegada de migrantes, dá-lhes algum dinheiro e passagem de ida para outro
lugar, desde que não apareçam mais por lá.
Em
São Paulo, os haitianos ficaram sob a proteção da Igreja Católica. No século
16, quando Anchieta andava pelo Brasil, a cultura europeia entendia que os
índios nem gente eram. Passaram-se cinco séculos, o governador Tião Viana
mandou refugiados haitianos para São Paulo e acusou a "elite
paulista" de "preconceito", quando uma secretária do governo
estadual classificou seu comportamento como "irresponsável".
Foi
ele quem exportou os refugiados, sem dar um só telefonema ao prefeito petista
Fernando Haddad. O problema que está no seu colo deveria ser tratado com o
ministro petista da Justiça, não com a empresa de ônibus. Não é justo que a
economia do Acre receba o impacto de 20 mil refugiados, mas a solução de Viana
foi demófoba e sua justificativa, demagógica. Salvo a elite petista, nenhuma
outra tem algo a ver com isso.
Os
haitianos estão amparados pela mesma fé que movia Anchieta, na paróquia de
Nossa Senhora da Paz. Faltaram recursos, comida e até mesmo colchões ao padre
Paolo Parise, que cuida do lugar. Há dias, voluntários começaram a chegar à
paróquia. Alguns foram cozinhar, outros ofereceram empregos. Até quinta-feira,
a paróquia não havia recebido qualquer ajuda federal, estadual ou municipal.
O
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, faz o que deve, o comissário
Fernando Haddad, também, e Tião Viana diz o que quer. Juntando tudo, nada.
LIÇÃO
DE ANCHIETA
Coincidindo
milagrosamente com o feriadão, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e seu
colega Ricardo Ferraço foram a Roma para assistir à cerimônia de canonização do
padre José de Anchieta.
A
gentileza dos senadores custou à Viúva R$ 9.000 em diárias, noves fora as passagens.
Essa conta não saiu por menos de R$ 30 mil. Não é muito dinheiro, mas é mais do
que Anchieta teve em toda a vida, andando pelos matos brasileiros.
O
santo escreveu um poema louvando o governador Mem de Sá. Num verso,
referindo-se aos índios que ele combateu, Anchieta ensinou:
"Para
este gênero de gente não há melhor pregação do que a espada e a vara de
ferro."
GLEISI E VARGAS
A
política paranaense faz milagres. Em 2011, quando o desempenho patrimonial de
Antonio Palocci levou-o à frigideira, a senadora perguntou a Lula se era
"estratégico" defender o comissário que comprometia o projeto
político do partido.
Passaram-se
três anos. O deputado André Vargas era um dos coordenadores da campanha da
senadora ao governo do Paraná. Ela lastimou suas traficâncias, sustentou que a
sua renúncia ao mandato é questão de "foro íntimo" e generalizou o
problema: "O fato em si foi muito negativo, não só para o PT, mas para a
política brasileira". Pegou leve.
PADILHA
A
vulnerabilidade da candidatura de Alexandre Padilha não vem só do que pode ter
acontecido no Ministério da Saúde quando ele lá estava.
Vem
da convicção com que defendia negócios que cheiravam mal e, comprovadamente,
revelaram-se escandalosos.
COMEMO-LO
Saiu
nos Estados Unidos um livro que retoma um mistério cinquentenário. O que
aconteceu em 1961 com Michael Rockefeller, filho de um dos homens mais ricos e
poderosos do mundo, quando estava na Nova Guiné pesquisando uma comunidade que
vivia na Idade da Pedra?
Na
versão oficial, o jovem de 23 anos morreu afogado. O jornalista Carl Hoffman
vai até o limite numa brilhante exposição do caso. Ele foi comido. Hoffman acha
que chegou aos nomes e às causas. Contudo, quando faltava a prova final -os óculos
de Michael-, venderam-lhe um modelo dos anos 90. O livro chama-se "Savage
Harvest" (colheita selvagem), e está na rede por US$ 12,99.
Os
magníficos totens que Michael recolheu na Nova Guiné estão no museu
Metropolitan de Nova York, numa ala que leva seu nome.
ESTATÍSTICA
Na
sua briga com a direção do PT, o deputado André Vargas teve o apoio de pelo
menos 30 dos 88 colegas da bancada-companheira.
Conseguiu-se
uma amostra do tamanho da banda que cultiva a tática do
"partir-pra-cima".
EREMILDO,
O IDIOTA
Eremildo
é um idiota e entendeu a decisão do Supremo Tribunal Federal. Fernando Collor
de Mello foi absolvido das acusações de corrupção, e João Goulart teve o seu
mandato restabelecido pelo Congresso. Ele lembra que houve uma época em que os
descendentes da família imperial brasileira tinham direito a passaporte
diplomático.
O
cretino acha que falta pouco para que se revogue o ato de rebeldia de Pedro de
Bragança em 1822. Quando isso acontecer, Eremildo poderá conseguir seu sonhado
passaporte da União Europeia.
O
FMI SABE TUDO, MAS NÃO CONTA O QUE FEZ
O
Fundo Monetário Internacional voltou a assumir funções oraculares em relação à
economia brasileira e advertiu para o alto grau de endividamento das empresas
nacionais. É provável que tenha razão.
Mesmo
assim, a doutora Christine Lagarde poderia ajudar a instituição que dirige,
abrindo os arquivos do FMI relativos ao que se chama de "crise da dívida
da América Latina", mas que também poderia ser chamada de "crise do
crédito da banca americana". Ela começou em 1982 e custou ao Brasil, com a
primordial ajuda de seu governo, a famosa "década perdida".
O
país devia mais de US$ 50 bilhões, os bancos sabiam que não teriam como
recebê-los e o FMI entrou na parada oferecendo socorros temporários, assumindo
o monitoramento da administração da economia brasileira. Chegaram a mandar
inspeções quinzenais a Brasília. Nesse período, o governo assinou seis (ou
sete) cartas de intenção. Cumpriu nenhuma.
Nos
arquivos do FMI pode estar uma chave desse mistério. Sabiam fazer contas, mas
não sabiam ler?
A
memória de um negociador brasileiro revela o seguinte: "Assinamos a
primeira carta por engano. A segunda, por distração. A terceira porque somos
mentirosos, mas você não acha que, a partir daí, ou mesmo antes, estava tudo
combinado?"
Ajudado pelo governo americano, o FMI fazia a segurança da banca. Em
1989, quando os balanços das casas credoras já permitiam que remanejassem suas
cifras, a Casa Branca empurrou-lhes goela abaixo um plano de espichamento da
dívida. O Citi tentou refugar, mas o secretário do Tesouro americano, Nicholas
Brady, ligou para o seu presidente, e ele cedeu. "Eu podia ouvi-lo com o
telefone longe do meu ouvido", contaria John Reed.