segunda-feira, 14 de julho de 2008



14 de julho de 2008
N° 15662 - Paulo Sant'ana


Intrépidos taxistas

Refletindo sobre a clareza de reflexos que tem de possuir um motorista, não posso deixar de dar razão aos que pretendem impor sanções rigorosas aos que empunham o volante sob o efeito do álcool.

Digo isso porque na semana passada fui transportado por dois motoristas de táxi e ambos tinham mais de 30 anos de serviço somente como taxistas.

Considerei-os homens extraordinários. Por sinal, no mundo moderno não pode haver nenhuma profissão que exija nível de atenção mais intenso do que a de taxista.

Teoricamente, o taxista detém mais responsabilidade social em sua profissão do que o piloto de avião.

Tanto que nos aviões pode ser ligado o piloto automático. Durante horas a fio, o avião navega com céu de brigadeiro, sem trânsito no ar, o piloto se mune de serenidade ímpar, pode se dar ao luxo de quase desligar-se completamente do seu mister, até mesmo porque sempre se faz acompanhar de um co-piloto.

Já isso não é permitido ao taxista, ele necessita estar atento em todos os minutos das cerca de 10 horas que trabalha por dia.

Se a responsabilidade de um condutor de caminhão nas estradas já é grande, a dos taxistas é maior ainda.

Pelo grau de atenção exigido ao máximo em um taxista urbano, as incidências e variantes do trânsito nas cidades não permitem que ele tenha um só segundo de descanso, qualquer distração, nenhuma folga em sua atenção permanente.

Fiquei pensando comigo: estes dois taxistas que me transportaram só por um milagre estavam ali do meu lado, a meu serviço.

Fiz a conta: cada um deles tem 100 mil horas de trabalho no volante. Um piloto de avião jamais atingirá esse índice.

Como é que esses dois bravos profissionais conseguiram sobreviver a esta vida inteira de aplicação acurada e incessante em sua profissão?

Como é que conseguiram ser fiscalizados cotidianamente por seus passageiros? Não é o caso dos pilotos de avião, que se encerram em suas cabinas e os passageiros não têm qualquer visão sobre seu trabalho.

Pois estes dois super-homens que me carregaram em seus táxis permanecem na mais perfeita integridade física depois de 100 mil horas de trânsito.

Não morreram e nem ficaram aleijados nesse trânsito selvagem e estafante. Uns heróis.

E se já é difícil para cada um dirigir numa cidade, imaginem para os taxistas, 10 horas por dia grudados no volante, nas horas do pico e nas horas mais folgadas, com engarrafamentos e com arriscadas manobras no trânsito, os seus nervos sendo moídos por intermináveis sinaleiras de troca de sinal com duração irritantemente longa.

E ainda por cima, os assaltos. Não bastassem os riscos de acidentes que correm os taxistas, todos os dias assumem a condição temerária de alvo quase preferido dos assaltantes, principalmente os que trabalham à noite.

Com todo taxista com que converso, sempre pergunto se já foi assaltado. E todos os taxistas com mais de cinco anos de atividade já foram assaltados.

Muitos já foram assaltados por cinco, seis, oito, 10 vezes. Com faca e com revólver. E se recordam dos assaltos com uma nostalgia sinistra, avaliando sempre como conseguiram escapar. E ao continuarem como taxistas, até pela experiência negativa, vivem sempre na expectativa de serem assaltados novamente.

É possível que já tenha havido, mas nunca soube de nenhum taxista que tenha trabalhado embriagado.

Como não é diferente para nenhum de nós, motoristas amadores, a façanha de se dirigir numa cidade, sejamos nós ou sejam os taxistas, todos temos de estar lúcidos e profundamente atentos para enfrentarmos o trânsito.

Por isso é que, como o trânsito exige atenção e destreza desdobradas, é inadmissível beber álcool e depois dirigir.

Valemo-nos do exemplo dos intrépidos e responsáveis taxistas. A eles, a homenagem de todos os cidadãos.

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