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terça-feira, 29 de julho de 2008
29 de julho de 2008
N° 15677 - Moacyr Scliar
Três boas notícias
O Brasil é mesmo um país surpreendente. Quando a gente começa a pensar que tudo é violência e corrupção, surge uma notícia inesperada.
Vejam os dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde, coordenada pelo Ministério da Saúde, e que agora estão sendo divulgados.
Em primeiro lugar, constata-se que, no caso das mulheres, a iniciação sexual faz-se cada vez mais cedo. Há 10 anos, 11% das garotas com menos de 15 anos já haviam tido uma relação sexual; agora, esta porcentagem triplicou, passando para 32,6%. E, caros leitores, qual foi o resultado? Um enorme aumento da prole?
Não. O número médio de filhos é de 1,8 por mulher. Há 10 anos, era de 2,5 e, baseado neste e em outros dados, o IBGE previa que o patamar de 1,8 filho resultante do decréscimo da natalidade seria atingido só em 2043. Pois chegamos ao patamar 35 anos antes do previsto.
E não é difícil apontar a causa. Há 10 anos, 73% das mulheres faziam uso de métodos contraceptivos; agora, esta proporção elevou-se para 87%.
Há 10 anos, apenas 7,8% das mulheres obtinham contraceptivos do SUS; agora, 21,3% o fazem. É claro que isto não é um fenômeno generalizado; a gravidez na adolescência continua a preocupar. Há 10 anos, 14% das meninas entre 15 e 19 anos já eram mães; agora, esta porcentagem é de 16%.
De qualquer modo, o fenômeno demográfico chama a atenção. De 1940 a 1960 o número médio de filhos por mulher era de 6,3. Era o que se chamava então de explosão demográfica.
As mulheres estariam pondo mais filhos no mundo por ignorância ou, pior, por uma espécie de perversão. Brasileiro era como coelho, reproduzia-se adoidado e de forma irresponsável. Agora constata-se que este raciocínio era um equívoco. Por que os brasileiros, sobretudo os pobres, tinham tantos filhos?
Não é difícil adivinhar a razão. Em primeiro lugar, a mortalidade infantil era muito alta; não se sabia quantas daquelas crianças iriam sobreviver. Depois, a maior parte da população era rural, e as crianças representavam mão-de-obra barata na agricultura; eram, pois, uma espécie de investimento.
Ou seja, o que havia não era uma irracionalidade, mas sim uma outra racionalidade, diferente daquela que tinham as pessoas de classe média e classe alta.
Na medida em que as pessoas se deram conta de que as crianças tinham mais chance de sobrevida, na medida em que a população urbanizou-se, que o nível educacional cresceu e que os contraceptivos estão mais disponíveis, a situação mudou.
São os números, os frios números, que o demonstram. E que nos dão uma lição: não existem mentalidades "superiores" e "inferiores", racionalidades e irracionalidades.
Existem diferentes tipos de racionalidade, como sabem muito bem aqueles que trabalham em saúde pública. Nada como um dia depois do outro, um número depois do outro, para demonstrá-lo.
Ainda falando em boas notícias: estive sábado na Olimpíada do Conhecimento, realizada pelo Senai na Fiergs, e fiquei entusiasmado com o que vi.
Centenas de jovens de várias cidades mostram suas habilidades em oficinas de várias áreas tecnológicas, metalmecânica, eletroeletrônica, construção civil, confecção e automotiva, entre outras. Ver é acreditar no Brasil.
Terceira boa notícia: a conquista do prêmio Camões por meu companheiro de geração literária, confrade de ABL e amigo pessoal João Ubaldo.
Já fiz parte do júri desse prêmio, em Lisboa, e sei como ele é disputado. João Ubaldo venceu porque é um grande escritor e um escritor autenticamente brasileiro. O Brasil está no pódio com ele.
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