quarta-feira, 23 de julho de 2008



23 de julho de 2008
N° 15671 - David Coimbra


O bordel das prostitutas virgens

Em Ulsan existe o bordel das prostitutas virgens. Juro, prostitutas virgens.

Fica na Coréia do Sul isso. Estive lá por 21 dias a fim de cobrir o Brasil na Copa do Mundo de 2002. Vinte e um dias em Ulsan. Um dos lugares mais aborrecidos do mundo. A cidade nem é pequena nem nada, tem o tamanho de Porto Alegre.

Mas trata-se de uma cidade industrial e, como toda cidade industrial, é cinzenta, poluída e triste. Um desses locais em que as pessoas só pensam em trabalhar. Nada de diversão, nada que não seja prático e monetário, só dinheiro, dinheiro, dinheiro.

Cedo da noite, a cidade fechava. Não havia mais nada para se fazer. Terminava minhas matérias invariavelmente depois da meia-noite, aqueles ulsanenses todos dormindo, eu querendo sair para comer um filé de três dedos de altura e tirar a poeira da garganta com uma cerveja gelada, mas quem diz que encontrava algum bom bar ou restaurante abertos?

De jeito nenhum. Caminhava pelas ruas e via tão-somente desolação. Imagino que na época, em Ulsan, eles passavam pela mesma onda moralista que passamos hoje no Brasil.

Um repórter carioca dizia que Ulsan era como enterro de pobre em dia de chuva, e era. Foi esse repórter carioca que descobriu o bordel das prostitutas virgens. Um bar chamado Seven, cheio de russas. As russas, como se sabe, são belíssimas. Sharapovas e Kournikovas são encontradas aos cardumes em cada beco sujo de Moscou.

Então, lá estavam todas aquelas russas dentro de minissaias sumárias, caminhando sobre saltos vertiginosos de botas que lhes escalavam joelhos acima, até as fronteiras das coxas macias.

Podia fazer frio que as russas se vestiam do mesmo jeito... despojado. Não eram freqüentadoras - trabalhavam lá. O lugar não era muito grande. Havia umas 15 mesinhas circulares, cantinhos escuros, música eletrônica, garçons e seguranças coreanos que deviam lutar kung fu.

Quer dizer: a aparência toda era de um bordel. Ou "boate de encontros", como se diz lá em Erebango. Porém, as mulheres estavam proibidas de fazer sexo. O repórter carioca se revoltou. Como assim??? Pode tudo, menos sexo???

Isso mesmo, elas podiam dançar com o cliente, conversar com ele, beijá-lo e acariciá-lo até que ele ganisse de angústia, mas, se chegasse ao sexo, poderiam ser expulsas da Coréia. Donde, o lugar ficou conhecido por toda a imprensa internacional como o bordel das prostitutas virgens.

t Essas russas, foi uma surpresa o que aconteceu com elas mais tarde e que vou relatar em seguida. Suponho que estivessem lá como uma concessão do governo coreano aos estrangeiros que visitariam o país durante a Copa do Mundo. A Coréia do Sul é uma democracia capitalista, mas o Estado jamais se omite.

Foram ações do Estado, conjugadas com a disciplina do povo, que transformaram a Coréia, arrancaram-na da miséria e a instalaram em confortáveis níveis de desenvolvimento. Ações voltadas para um único setor: a Educação.

Visitei famílias comuns de coreanos, fui as suas casas e constatei que os pais dão à educação de seus filhos o status de primeiríssima prioridade. O mesmo aconteceu com vários países hoje com bom padrão de desenvolvimento, como Vietnã, China, Cingapura e Japão, sem citar os ocidentais.

Na Coréia, todo o ensino básico e secundário é gratuito e todas as crianças são obrigadas a ir à escola. Em compensação, o terceiro grau é pago, mas, mesmo assim, oito de cada 10 coreanos vão para a universidade.

Os pais coreanos não se limitam a pôr os filhos no colégio. Financiam-lhes cursos de inglês, de informática, de balé, de história, de piano, de tudo o que lhes puder complementar a educação. Quando os índices das escolas saem, os coreanos festejam como se fossem vitórias de seus times de futebol. E foi isso que um pai coreano me disse:

- Vocês, brasileiros, vibram com o futebol; nós com a educação.

O que me faz lembrar de uma frase do centroavante francês Thierry Henry sobre o virtuosismo dos jogadores brasileiros:

- Os brasileiros são bons de bola porque seus filhos, em vez de estar na escola, estão jogando futebol.

Muito certo. Uma frase de centroavante. Fico pensando que nós, tratando com seriedade o ensino básico e o médio, poderíamos construir uma sociedade desenvolvida e mais justa, como a Coréia, mas sem a chatice de um lugar como Ulsan, feio, cinza e triste, um lugar que mantém intocadas até mesmo as lindas russas do insólito bar Seven.

Se bem que, ao que demonstram os indícios, as russas não ficaram tão intocadas assim. Um dia, eu e mais alguns amigos repórteres do Riosãopaulo estávamos entrando no hotel da Seleção e quem vemos saindo, risonhas e buliçosas? As russas! O repórter carioca as abordou, indignado:

- O que vocês estão fazendo aqui??? E a mais bela delas, uma loira de pernas sem fim e olhos de mel, respondeu, sorrindo:

- Visitamos os jogadores de vocês. No dia seguinte, só saíram notícias negativas a respeito da Seleção .

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