19 de Novembro de 2024
CONSCIÊNCIA NEGRA
CONSCIÊNCIA NEGRA
20 de novembro - Uma voz inspiradora contra o preconceito
Único treinador negro na Série A do Brasileirão, Roger Machado assumiu um papel importante na luta antirracista no futebol ao marcar posição com clareza sobre o tema. O atual treinador do Inter é um dos personagens de série especial do Grupo RBS sobre o mês da consciência negra
Mariana Dionísio - Manuela Ramos - João Praetzel
Penso que tivemos evoluções, o país começou a olhar para essa questão. Porém, vejo que os avanços ainda são pequenos. Para mim, o futebol amplifica, cristaliza e aponta o que somos como sociedade. Se a gente imaginar o futebol como uma pirâmide social, na base está o campo. Sejamos pretos ou brancos, quem olha de cima da pirâmide enxerga todos pretos. Ou somos pretos pela cor da pele, ou pela mesma origem social, em sua maioria esmagadora - disse Roger após a vitória sobre o Fluminense, ao ser indagado a respeito do Dia da Consciência Negra.
O ex-jogador sempre foi uma voz marcante na luta antirracista. É um dos maiores apoiadores do Observatório Racial do Futebol, dirigido por Marcelo Carvalho, amigo do técnico.
- Hoje, o futebol está descobrindo que o racismo não é só quando alguém chama uma pessoa negra de macaco. O racismo está quando a gente não vê treinadores negros, não vê gestores negros. Roger hoje não é só uma inspiração para que a gente sonhe em ser jogador de futebol, ele é uma inspiração para quem também sonha em ser treinador de futebol, em ser gestor de futebol - afirmou Carvalho.
Dos seus quase 50 anos, o treinador passou também a ajudar projetos paralelos, como o Diálogos da Diáspora, de publicação de livros de diversas áreas do conhecimento, para dar voz a quem nunca teve.
- O Roger traz para a realidade algo que certamente algumas pessoas preferem silenciar. É mais fácil silenciar. A gente vê cada vez mais alunos negros e indígenas no espaço universitário. E a gente viu que o mercado editorial não seguia na mesma velocidade. E foi em torno desse desejo de abrir o mercado editorial para promessas, para futuros autores e autoras, que a gente criou isso - conta Tadeu de Paula, coordenador do projeto.
Da literatura para a música, o espectro cultural do treinador foi aflorado por sua família, sempre com a negritude sendo o fio condutor entre tudo isso.
- Eu li e comecei a cultivar o hábito da leitura. Ler me deixou muito mais crítico sobre a vida, sobre tudo. Hoje, talvez os quilombos modernos sejam as escolas de samba, como lugares de resistência da cultura negra - ressaltou em entrevista ao ge.globo em 2022, quando ainda treinava o Grêmio.
Não por acaso, com a marca da família Machado, a Imperatriz Dona Leopoldina escreveu um samba-enredo para o carnaval 2025 com a temática "A cor do futebol - A Imperatriz marca um gol contra o preconceito racial", em que o técnico do Inter é um das fontes de inspiração.
- Sendo o único treinador da Série A, de um time gaúcho, caracterizado por ser o time do povo, que tem a mascote negro e que por vezes foi chamado de macaco, Roger merece estar em um lugar de destaque no nosso desfile para provar que o lugar do negro não pode ser delapidado. Ele deve hoje ser encarado como um lanceiro negro - defende Luiz Augusto Lacerda, carnavalesco da Imperatriz Dona Leopoldina e primo de Roger.
Um dos trechos do Samba dos Guris, que estará no Porto Seco no ano que vem, diz o seguinte:
"É flecha certeira na intolerância
Real negritude a enfrentar
Denunciar essa tamanha ignorância
Coragem de virar o jogo
Sigo a te observar
A luta não pode parar."
Versos que poderiam ter sido escritos por Roger. Homem, técnico e negro. Exemplo de uma voz do presente, criada no passado, que vai ressonar no futuro.
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