Todas as pressões para o dólar acima de R$ 6
A sexta-feira vai passar para a história econômica porque o dólar ultrapassou uma grande barreira psicológica, a de R$ 6. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva responde pela marca neste momento porque a avaliação política equivocada pressionou o câmbio.
Mas a órbita poderia ter sido atingida, em outro momento, por força das medidas protecionais de Donald Trump, por exemplo. Ao longo do ano, houve várias fontes de pressão cambial, da própria eleição de Trump a guerras pelo mundo, passando pela longa novela do corte de juro nos Estados Unidos.
Na sexta, até uma boa notícia contribuiu para a alta do dólar: a menor taxa de desemprego da atual série histórica, de 6,2%. A corrente dominante dos economistas avalia que, quando o mercado de trabalho está aquecido, há mais risco de aumento da inflação. Por isso o dólar subiu várias vezes depois de dados de contratações nos EUA, porque "atrapalhava" a redução de juro por lá. É cruel, insensível, absurdo? Pode ser.
Digital de Lula, mas muitos fatores
Até o calendário pesou: a sexta foi o último dia útil do mês, quando é fechada a taxa Ptax, referência para contratos cambiais de mercadorias e derivativos. Como sempre ocorre, há muita especulação entre quem vai ganhar e quem vai perder com a cotação. Grandes quebras de barreira são como quedas de avião, nunca são resultado de apenas um problema.
Mas é claro que a maior pressão veio da desconfiança do mercado em relação ao pacote. E não apenas pelo ruído da isenção, também pelo conteúdo. As medidas apresentadas depois de semanas de negociação foram desidratadas em relação ao plano inicial. Embora no cálculo do governo representem economia de R$ 70 bilhões, nas contas de especialistas renderiam ao redor de R$ 45 bilhões.
E agora? Um sinal positivo foi o fato de a cotação ter baixado de R$ 6,116, a máxima do dia, quando os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e até o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deram declarações relativizando a isenção. _
Ao falar sobre intervenção do Banco Central (BC) no câmbio, seu futuro presidente, Gabriel Galípolo, afirmou que "falou com Roberto (Campos Neto)" e ambos concordam que só faz sentido quando há "disfuncionalidade".
Como ficaria o mínimo no pacote
A proposta do pacote de corte de gastos é limitar o aumento real a 2,5%, mesmo teto de despesas que existe no novo marco fiscal. Vai continuar subindo acima da inflação - o que não ocorreu entre 2019 e 2022, período em que era corrigido só pelo INPC. A partir de 2023, o cálculo voltou a ter crescimento do PIB. Por essa regra, para 2025 o reajuste do mínimo incluiria a inflação pelo INPC acumulado neste ano, com projeção ao redor de 4,5% (com base na projeção do Focus para o IPCA, que é de 4,63% e considerando que o INPC costuma ser ligeiramente menor), mais a variação do PIB de 2023, de 2,9%. Com o pacote, o adicional seria de 2,5%.
Na tabela acima, é possível ver que a diferença é de R$ 6. Claro, ainda é uma projeção, não um cálculo exato, mas a variação será pequena. Mesmo assim, nas contas do governo, a economia com a mudança será de R$ 2,2 bilhões em 2025, e poderia chegar a R$ 35 bilhões em 2030. O efeito nos gastos é grande porque todos os benefícios da previdência são vinculados ao mínimo. _
A diferença
Projeção para 2025 R$
Sem pacote 1.518
Com pacote 1.512
"Salutar", mas "insuficiente"
Espécie de "xerife das contas públicas", a Instituição Fiscal Independente (IFI) considera o pacote de corte de gastos "insuficiente para a reversão de déficits primários".
No entanto, vê a limitação do aumento real dos gastos ao teto do arcabouço fiscal (2,5%)como "salutar", já que "as despesas fora do limite podem comprimir as demais". _
"Governo cometeu um erro crasso"
Pesquisador associado da Fundação Getulio Vargas (FGV), Fabio Giambiagi é autor ou coautor de cerca de 30 livros sobre finanças públicas. Aqui, detalha as desconfianças sobre os anúncios do governo.
A confusão
"O governo cometeu um erro crasso de estratégia política falando em isenção do IR. É algo que só deve ter efeito a partir de janeiro de 2026. Contaminou toda a discussão que seria imediata acerca de medidas que devem vigorar em 2025. Então, é incompreensível."
As medidas
"Deixamos de discutir aquilo que é essencial, que são as medidas, também envoltas em dúvida. A dos militares tem efeitos ínfimos, a do abono traz efeitos minúsculos nos próximos dois ou três anos, o salário mínimo subir 2,5% em vez de 3% não faz tanta diferença."
Efeito negativo
"O efeito foi o oposto, com o agravante de que, do jeito que a discussão foi encaminhada, atropelou outras agendas. A reforma tributária ficou para trás e até as medidas do ajuste ficaram em segundo plano diante dessa discussão um pouco esotérica sobre a isenção do IR, que só vai entrar em pauta no que vem."
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