08 DE FEVEREIRO DE 2023
OPINIÃO DA RBS
AUTONOMIA NECESSÁRIA
Em vigor há dois anos, a autonomia do Banco Central (BC) foi um avanço institucional do Brasil e deve ser defendida. Trata-se da garantia de que a autoridade monetária não estará sujeita aos humores do governo de plantão e a pressões políticas que poderiam levar a decisões de cunho populista, que comprometem a estabilidade e a credibilidade do país. Um dos pilares dessa independência é o mandato fixo de quatro anos do presidente do BC, em um período descasado do calendário das eleições gerais.
É ainda uma prática alinhada às melhores experiências internacionais, adotada por nações como EUA, Reino Unido, Coreia do Sul, Japão, Nova Zelândia, Chile e países da zona do euro, por exemplo. No Brasil, a prioridade do BC é assegurar o poder de compra da moeda, o que significa buscar manter a inflação sob controle, com instrumentos como a modulação da taxa Selic.
Nos últimos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou reiterado descontentamento com o BC pela sinalização de que existiria até a possibilidade de elevação do juro básico da economia, conforme o comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) na última quarta-feira, quando o colegiado manteve a taxa em 13,75% ao ano. As incertezas fiscais internas seriam um dos motivos. Ao voltar a criticar a independência da autarquia, Lula reaviva temores ainda frescos na memória dos brasileiros, quando um BC dócil aos objetivos políticos do governo levou a uma redução artificial do juro, um dos componentes que levaram ao desastre econômico do período 2015/2016.
Agências reguladoras têm funções e naturezas diferentes, mas, da mesma forma, seus presidentes contam, desde 2019, com mandatos fixos e não podem ser demitidos pelo presidente da República. Foi possivelmente a força desse outro avanço institucional que impediu a exoneração de Antonio Barra Torres da Anvisa no período mais crítico da pandemia, garantindo uma avaliação séria e científica das vacinas contra a covid-19.
Ninguém ganha se a crise entre o Planalto e o BC escalar. Pelo contrário, os indicadores financeiros, como as expectativas de inflação, deterioram-se, o que pressiona ainda mais o juro, deixa o controle da inflação ainda mais custoso e afeta a economia. É momento de prudência e apaziguamento.
Não é possível levar a sério a suspeita nutrida em alas do governo de que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro, estaria levando o país a uma recessão por motivações políticas. Mesmo que Campos Neto tenha, em alguns momentos, de forma imprudente, manifestado preferências e proximidades, algo inadequado com a independência esperada do principal membro da autarquia. A autonomia também precisa ser ratificada nos pequenos gestos. Todos os diretores do BC, de perfil técnico, têm nome e currículo a zelar e não manchariam suas reputações por picuinhas.
Ontem o Banco Central divulgou a ata da reunião do Copom e registrou que "alguns membros (do colegiado) notaram que a execução do pacote apresentado pelo Ministério da Fazenda deveria atenuar o risco fiscal e que será importante acompanhar os desafios na sua implementação". O trecho foi interpretado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como uma sinalização de boa vontade do comitê, atenuando um pouco as tensões dos últimos dias.
Não há dúvida de que juro de 13,75% ao ano, que faz o país a ter a maior taxa real do mundo, é altíssimo. Mas é necessário reduzi- lo de maneira sustentável. Para isso, é imprescindível que as políticas fiscal e monetária remem para o mesmo lado. Lula pode colaborar, evitando ruídos.
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