07/02/2023
- 16h24min
Fabricio
Carpinejar
Quanto menor a bola, mais nobre o esporte
As
únicas práticas desportivas que fogem à regra são o pingue-pongue e a sinuca.
Mas são feitas na mesa, daí não valem
Quanto menor a bola, mais nobre e caro o esporte. Tenho amigos que jogam tênis. São ricos. Tenho amigos que jogam golfe. São milionários. E ainda não tenho amigos que jogam polo montados em cavalos, porque são da realeza britânica.
Não
gostaria que entendesse o que falo como preconceito, pode debitar na inveja.
Admiro
os uniformes brancos, imaculados, engomados do tênis e do golfe. Devo ter sido
reprimido na infância para não usar branco. Iria encardir as roupas. Se
aparecesse enlameado, eu precisaria arcar com as consequências e xingamentos
maternos. Evitava até o tênis Rainha, que seria batizado pelos colegas e
pisoteado sem piedade até perder a sua alvura.
Já as bolas maiores indicam a classe média dos seus usuários. Basquete, vôlei e futebol — para quem não é profissional — são próprios de pessoas menos abastadas. Normais como eu. Representam paixões ambulantes. Você compra a bola e sai jogando, não depende de nenhum outro acessório. As quadras também são acessíveis. Não requerem clube privado, pulseira vip, torneios secretos, recomendação de associado, hierarquia por antiguidade.
Mesmo
a ausência de campinho não é impeditiva. No vôlei, criam-se rodinhas. No
basquete, há a disputa mano a mano ou em duplas. No futebol, basta um pedaço de
gramado e traves são improvisadas com tijolos ou chinelos.
Você
não sofre para comprar equipamentos. No golfe, eu conseguiria adquirir apenas o
figurino: as luvas, a bermuda, a camisa polo e os sapatos impermeáveis com
pontas. Eu me restringiria a atingir a aparência de golfista.
Ter
quatorze tacos de qualidade significaria quase dez mil reais, afora bolinhas,
tee e bolsa. São muitos buracos financeiros para tapar. Muito mais do que
dezoito. É como pagar o aluguel de um apartamento para arremessar a esfera em
curva, fugindo dos obstáculos como lagos, árvores, montanhas, rios ou bunkers.
Nenhum dos meus filhos adultos aceitaria ser o meu caddie de graça. Só o golfe exige a contratação de um estagiário. Quem me dera desfrutar de condições. Sinto que sofro de agorafobia monetária.
Quando
me aposentar, certamente estarei enfurnado na cancha de bocha em Capão da
Canoa. Na competição praiana, a intuição dispensa os óculos. Não me imagino em
gramados áureos e palacianos mirando o impossível. A essa altura da vida, já
não passarei no teste de vista do Detran.
As únicas práticas desportivas que fogem à regra são o pingue-pongue e a sinuca. Mas são feitas na mesa, daí não valem. Talvez o beach tennis decrete o fim do elitismo das bolas menores. Vem engatinhando com enorme sucesso como uma derivação descolada e popular no emprego das raquetes.
Das
esferas miúdas, eu somente me dei bem com as bolinhas de gude. Aliás, elas não
deixavam de representar uma riqueza, uma valiosa moeda de troca no recreio, e
terminariam garantindo a minha sobrevivência ao bullying.
Nenhum comentário:
Postar um comentário