07 DE DEZEMBRO DE 2022
CARPINEJAR
Sambando na cara dos europeus
O ex-jogador do Manchester United e comentarista da TV britânica Roy Keane criticou as dancinhas dos brasileiros durante a vitória do Brasil sobre a Coreia do Sul, por 4 a 1, nas oitavas de final da Copa do Mundo no Catar.
Chegou a insinuar que estavam protagonizando um programa de auditório, tipo Dança dos Famosos, e que desrespeitaram os coreanos. É um equívoco do eurocentrismo, habituado a subjugar manifestações de outras etnias. Existe uma visão europeia que não entende a cultura brasileira, censurando a felicidade no ambiente da disputa. A postura tem um pouco de xenofobia e muito de racismo estrutural.
Tanto que Vinicius Júnior já foi alvo de ofensas racistas em setembro, quando celebrou os gols sambando em jogo pelo Real Madrid. O atacante da Seleção repetiu a dose na Copa do Mundo, em seu primeiro gol. Convocou os companheiros para o embalo do Pagodão do Birimbola, de Os Quebradeiras Mousik e Machadez.
Comemorar o gol dançando não é desprezo ao adversário, mas celebração da alegria do trabalho coletivo. Não tem nada a ver com o rival, e sim com a união do plantel. Os rabugentos de plantão acreditam que dançar é distração desnecessária, perda de foco, um indicativo de ausência de disciplina.
Pelo contrário, muito antes do Carnaval, os povos indígenas dançavam para mobilizar a tribo contra inimigos externos, os povos africanos dançavam para unificar as suas forças contra invasões. É como uma marcha da vida, um reagrupamento para as batalhas, uma concentração a partir da música e da coreografia para a coesão do exército.
O que parece ser uma diversão ou uma algazarra, ou até mesmo uma provocação, é, na verdade, uma dança de guerra.
Os mesmos jogadores que concretizam a jogada ensaiada dos treinos se põem lado a lado para demonstrar cumplicidade entre eles. Revelam uma motivação ainda maior para alcançar os resultados, firmando uma parceria e uma igualdade dentro do campo.
É uma harmonia do trabalho que culmina com a sintonia da celebração. Não estão comemorando o gol individualmente, como se fosse mérito exclusivo de quem balançou as redes. Extrapolam o egoísmo da autoria e consagram a colmeia, o formigueiro, o conjunto do time.
É um reconhecimento que não se restringe ao artilheiro. O ato valoriza ainda quem desarmou, quem fez a assistência, quem puxou a marcação para si. A dança é dividir os louros da conquista. É também quando o craque evidencia que é parte da torcida, que é a representação da torcida no gramado.
Cara fechada e esgar não representam profissionalismo. É recomendável fazer o que se gosta e ter entusiasmo exercendo suas funções técnicas. Portanto, riso e rigor não são excludentes. Do mesmo modo, há uma ditadura da crítica esportiva para caracterizar embaixadas ou dribles durante uma goleada como atitudes antidesportivas. Para mim, gesto antidesportivo é tropeçar bisonhamente na bola.
Quando o técnico Tite entrou com seus atletas no movimento de imitação do pombo, depois do gol de Richarlison, provou que é um guerreiro. É como pintar o rosto, é como bater no peito, é como rodear uma fogueira, é explodir emocionalmente em busca de um objetivo. É a nossa alegria ancestral de estar competindo em alta performance.
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