12 DE DEZEMBRO DE 2022
CARPINEJAR
A fuga de Tite
Nunca poderemos prever como agiremos no desespero. Há quem diante de um luto chore sem parar, há quem não seja capaz de derramar uma lágrima durante anos. E das duas formas se sofre com igual intensidade. Uns explicitamente, outros ruminando por dentro.
A dor é pessoal. Não existe uma regra, um manual catártico de nossas emoções. Tite foi considerado um covarde. Porque, como líder e técnico do grupo, deveria ter ficado em campo consolando seus jogadores. Eu consigo ter empatia com a angústia antissocial dos perdedores. Não vejo a sua debandada como arrogância.
Dificilmente, após um fragoroso fracasso, não somos tomados pelo desejo de desaparecer por um tempo da vista de todas as pessoas próximas. Talvez Tite, que sempre transmitiu segurança e fortaleza, precisasse ser consolado pela primeira vez. Ele não aguentou a pressão. Não suportou o desgosto. Não tendo nem o que dizer para si mesmo, como encontrar palavras de conforto para os outros?
Ele viu o seu maior sonho como treinador ruir. Não terá uma terceira chance da CBF. Era como se tivesse a sua honra de repente roubada, o respeito dilapidado, o posto de timoneiro derrubado. Era um pombo ferido em pleno voo depois de dançar, de se expor, de acreditar que o hexa era possível.
Percebo, pela sua reação despropositada, que ele não cogitava a eliminação em nenhum momento. Não havia se preparado para o pior, tanto que virou as costas para os seus meninos protegidos como nunca fez em sua trajetória de seis anos e meio com a camisa amarela. Não conseguiu ser aquele Tite solidário que amparou a equipe na desclassificação para a Bélgica.
Dessa vez, mostrou-se humano, falível, desajeitado. Quis sair de perto das câmeras e dos holofotes para soluçar em paz, sem dar explicações. Dependia urgentemente da solidão. Reivindicava a aridez descomunal do deserto do silêncio.
Óbvio que errou ao não protagonizar a cena esperada de fraternidade na derrota. Deve esclarecimentos e desculpas. Trocou os pés pelas mãos, pois acabou arrastado por uma rejeição violenta. Pela situação totalmente diferente, não havia nem sentido imitar a cordialidade do técnico japonês, que se curvou para a torcida. Japão chegou aonde ninguém esperava.
No caso de Tite, ele caiu muito antes das expectativas. Seu coração o vaiava. Dentro dele, só havia uma voz gritando: "Me tirem daqui! Me tirem desse estádio!". Uma voz que o tirou dos trilhos e o pôs a correr na direção contrária de sua teoria.
Ele estava absolutamente envergonhado. Sentia culpa por não conduzir a Seleção Brasileira para uma semifinal apesar da vantagem na prorrogação. Sentia culpa por não escalar Neymar para o primeiro pênalti. Sentia culpa por tirar precocemente Vinicius Júnior.
Mas não é um vilão, não merece ser cancelado, não pode ter a sua brilhante carreira guilhotinada. Dunga sofreu o mesmo boicote quando caímos diante da Holanda - tanto que não voltou a atuar na casamata. Sei que o meu posicionamento é até antipático diante da execução sumária de Tite pela opinião pública.
O que ele aguentou não temos ideia. Só enxergamos seu transbordamento de indiferença, sua fuga, seu despreparo para a crítica, sua inaptidão para abraçar os seus soldados abatidos. Ele não tinha mão para estender, estava completamente afogado em sua mágoa. Buscava uma fresta para respirar fora.
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