15 de dezembro de 2015 | N° 18386
DAVID COIMBRA
Não salvo mais o Brasil
Tentei salvar o Brasil durante todo o ano. O Brasil, teimosamente, recusou-se a ser salvo por mim. Aquelas minhas ótimas ideias sem nenhum aproveitamento... Que lástima.
O futebol brasileiro, da mesma forma, tem feito ouvidos moucos às minhas sugestões brilhantes, o que muito me entristece, ainda que isso tenha me dado a oportunidade de usar essa expressão de que gosto tanto, “ouvidos moucos”.
Os dirigentes da dupla Gre-Nal riem-se à grande quando falo em centroavantes, quando não se riem à socapa ou à sorrelfa, outras duas expressões que estava ansioso para empregar.
Já o prefeito e os vereadores de Porto Alegre fazem troça das minhas opiniões.
E o governador dá de ombros quando falo.
Em meio a tamanha indiferença à minha presuntiva sabedoria, o que farei?
Nada.
Serei indiferente também.
Neste fim de ano, quero apenas me divertir. Nada de falar de coisas ruins. De Dilma, só quero saber de seus discursos, que são engraçados. De Temer, só quero saber de seu latinório, que é instrutivo. De Cunha, só quero saber de suas senhas de banco, que são debochadas. De Kátia Abreu, quero distância, quando ela estiver bebendo.
Nada de falar de dólar. Dólar é assunto que me deixa pensativo.
Sabe aquele urso que ficou preso só num pedacinho de gelo boiando no mar do Polo? Aquele urso que é usado em tudo que é matéria sobre aquecimento global? Pois é. Não me falem daquele urso, a não ser que vocês saibam que ele conseguiu sair do bloco de gelo e anda feliz pela neve, comendo peixe com sua ursa.
Os refugiados. Falem-me dos refugiados que estão contentes da vida, trabalhando como taxistas na Alemanha, bebendo Paulaner e comendo salsicha.
Crianças. Esse é um ponto fundamental e definitivo. Não posso ver criança sofrendo nem em filme, nem em notícia de jornal, nada. Esses dias, assisti a um anúncio de um hospital de câncer infantil aqui de Massachusetts e quase chorei. Só não chorei porque sou do IAPI, mas dei uma fungada. Então, não quero saber de criança sendo maltratada.
Bicho também não. Nem velho. Nem ninguém.
Vou esquecer o Estado Islâmico machucando pessoas, vou esquecer os traficantes queimando gente nos morros do Rio, vou esquecer terroristas que se explodem para matar quem só pensa em namorar e se divertir num show ou num restaurante, vou esquecer os que fazem tudo por dinheiro, religião ou ideologia.
Homens, mulheres, gays, brancos, ricos, pobres, negros, anões, japoneses, socialistas, liberais, muçulmanos, cristãos, judeus e budistas, anuncio agora que farei como os meninos de oito anos, que é a idade do meu filho. Um menino de oito anos, para ser amigo de outro menino de oito anos, só precisa de uma coisa: que exista por perto outro menino de oito anos. Aí ele vai até a casa dele e bate. O outro abre. E ele diz:
– Vamos brincar? O outro responde: – Vamos.
E eles brincam, felizes. E se tornam amigos para sempre, porque, seja lá no que se transformem depois dos oito anos, o que mais importa é o que eles tinham aos oito anos, que é a vontade de viver bem com as outras pessoas. O que, na verdade, não é o que mais importa: é tudo o que importa.
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