sexta-feira, 11 de dezembro de 2015



11 de dezembro de 2015 | N° 18382 
DAVID COIMBRA

Cunha é Pelé

Eduardo Cunha está dando uma lição ao Brasil. Que show de habilidade legislativa. Eduardo Cunha é o Pelé do regimento interno, o Garrincha dos malabarismos de alcova política.

Devia estar preso, talvez seja, acho que será, espero que sim, mas, antes de ser, está demonstrando, pela primeira vez na história da República, todo o poder de um poder. Nem o grande Ulysses Guimarães, 11 vezes presidente da Câmara, o pai zeloso da Constituição de 1988, nem Ulysses usou com tanta agudeza o poder do Poder Legislativo.

Até porque Ulysses tinha escrúpulos.

Mas não é só esse Eduardo Cunha solerte, malicioso, conspirador, tapado de denúncias e acusações, não é só ele que está nos ensinando algo precioso sobre nós mesmos. Também essa Câmara que ele preside dá, todos os dias, um recado importante aos brasileiros. Pense nas trocas de sopapos e de injúrias ocorridas na sessão de ontem da Comissão de Ética. 

Pense na Maria do Rosário chamando Paulinho da Força de “cachorro”. Pense em Bolsonaro dizendo que não estupraria Maria do Rosário, por achá-la feia. Pense nos deputados do PT quebrando urnas eletrônicas. Pense nos deputados da oposição carregando bonecos “Pixulecos” no plenário. Pense em tudo isso.

Você deve estar enojado. Deve estar pensando que esse Eduardo Cunha e esse Congresso não podem levar adiante um processo de impeachment da presidente da República.

Você tem razão. Eles não têm nenhuma credibilidade.

Mas agora pense no outro poder, o Executivo. Tem-se dito de Dilma que ela é incompetente, mas honesta. Na sua vida privada acho que é, de fato. Mas será que se pode dizer o mesmo de seu governo? Será que ela não tem responsabilidade, por exemplo, pela dúzia de ministros afastados devido a denúncias de corrupção? 

E o mentor do programa Mais Médicos, que jogou dinheiro pela janela de um prédio do Recife, quando viu a chegada da Polícia Federal? E seu líder do governo, Delcídio do Amaral, que está preso? E os tesoureiros do seu partido, que foram presos também? E a compra escandalosa da Usina de Pasadena, concretizada quando ela estava no conselho da Petrobras?

Lula, ninguém menos do que Lula, reconheceu que Dilma disse uma coisa durante a campanha e fez outra no governo. Ou seja: ela mentiu. Para sustentar a mentira, praticou as tais pedaladas fiscais, tomou empréstimos indevidos. Isso não é bastante condenável? E as acusações dos delatores, que afirmam que o dinheiro da campanha foi ilícito? Dilma não é uma pateta, não é uma pobrezinha que se deixa abusar por malvados espertalhões. Dilma tem, sim, sua responsabilidade pelo que está acontecendo.

Não, não... Nosso Executivo está no mesmo nível do nosso Legislativo. Se é incômodo apoiar um pedido de impeachment movido por ESTE Congresso, presidido por ESTE deputado, é igualmente incômodo apoiar a continuidade DESTA presidente da República.

E aí está a lição que nos ensinam os atuais Legislativo e Executivo brasileiros: o Brasil tinha de ser um país parlamentarista.

Se você pensa que o parlamentarismo daria mais poder a um parlamento desacreditado, digo que não: o parlamentarismo depura o parlamento. Numa crise como a de agora, o primeiro-ministro e o Congresso cairiam, e novas eleições seriam convocadas. Começaríamos tudo de novo. Seria uma bela saída. Democrática, legítima e limpa. Como tem de ser.

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