23 de dezembro de 2015 | N° 18394
ARTIGO - JOSÉ ANTONIO PASTORIZA FONTOURA*
VAMOS DEIXAR QUE RAPOSA E GALINHEIRO SE ENTENDAM?
Não bastasse a proposta de levar a terceirização para a atividade-fim, um novo ataque aos direitos dos empregados se esconde sob o encanto da modernização das relações de trabalho. Enxertado na Medida Provisória (MP) 680, o princípio do negociado sobre o legislado é a volta da retórica empresarial da livre negociação sindical.
Conheço essa velha novidade há décadas, e seus defensores não medem esforços para implementá-la. Vou contar um episódio apenas. Em 1989, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) bateu à porta da ministra Dorothéa Werneck para sugerir um esboço de MP com alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Em relação à proteção da mulher, por exemplo, eliminamos as proibições de trabalho noturno, perigoso e insalubre, o que a doutrina passou a chamar de “Direito promocional e protetor”, pois alavancou a participação feminina no mercado. Outra mudança consistiu em estabelecer prazos para o pagamento da rescisão contratual e punições em caso de descumprimento. Em uma época de inflação alta, os trabalhadores tinham enorme prejuízo por atrasos na quitação.
Conquistado o apoio da ministra, era hora de convencer o restante do governo. Nas negociações, um interlocutor da Presidência, com origem no meio empresarial, ofereceu ao sindicato uma contraproposta: “O que os fiscais do Trabalho querem de fato é a equiparação salarial com os auditores da Receita Federal, não? Eu garanto a aprovação da equiparação, mas desistam da MP. Deixem que patrões e empregados se entendam”. Respondemos que não éramos vendilhões dos trabalhadores e que preferiríamos continuar com o salário mais baixo a abrir mão da MP, que felizmente acabou convertida na Lei 7.855/89 por força da ministra.
Passadas mais de duas décadas, o velho chavão retorna no princípio do negociado sobre o legislado. Seus defensores dizem que os direitos trabalhistas estão garantidos na Constituição. Aí está o engodo. A maior parte dos direitos é regulada pela legislação ordinária, a ser atropelada pelo instrumento que permite que “patrões e empregados se entendam”.
O Direito Coletivo do Trabalho, por acordo ou convenção, tem por finalidade a melhoria da condição social e econômica do trabalhador e não o contrário. Vamos à luta, pois estão querendo a volta do “laissez faire, laissez passer”, ou, numa tradução livre e popular, “deixem que a raposa e o galinheiro se entendam”.
*Ex-presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e ex-professor de Direito do Trabalho da Unisc
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