segunda-feira, 6 de julho de 2015



06 de julho de 2015 | N° 18216
L. F. VERISSIMO

Os caras

O mundo dá muitas voltas. Acabei de criar esta frase, podem me citar. Quando os dois se encontraram pela primeira vez não me lembro onde, o Barack Obama apontou para o então presidente Lula e disse “Esse é o cara”. O cara presidia um dos poucos países que davam certo, na época. A crise generalizada no mundo parecia não ter chegado ao Brasil, onde os índices econômicos, maquiados ou não, eram positivos, havia pouco desemprego, e acontecia o milagre de um governo voltado para o social convivendo sem maiores melindres com um patriciado conservador.

Lula estava em alta. Em contraste, o Baraca estava em baixa. A oposição dos republicanos ameaçava paralisar seu governo, seus planos de reforma social não saíam do chão, sua política externa hesitante não agradava nem a pombas, nem a falcões. Seu elogio ao Lula era uma brincadeira simpática, mas com um certo tom de inveja. Ninguém, na época, salvo talvez a Michelle, chamaria Baraca de “o cara”.

Corta para a visita da Dilma aos Estados Unidos, na semana passada. O mundo deu as suas voltas e tudo mudou. Hoje o cara indiscutível é o Baraca. Sua política de recuperação econômica, apesar de ele não contar com maiorias no Congresso, está dando resultados.

O maior legado da sua administração, um plano nacional de saúde que tira os Estados Unidos da incômoda posição de única nação rica da Terra a não ter um programa de cobertura universal, foi aprovado pela Corte Suprema, depois de combatido, chamado de “socialista” e “antiamericano” e demonizado pela direita. A decisão a favor do “Obamacare”, apelido do seu plano de saúde, foi apenas uma das surpreendentes boas notícias que o Baraca recebeu do Supremo Tribunal Americano, reconhecidamente conservador. A liberação do casamento homossexual em todo o país foi outra.

Nos Estados Unidos, estão comparando os juízes supremos a velhos sisudos que, de uma hora para outra, decidiram arrancar as togas e mostrar suas bermudas coloridas.

Não sei se o Baraca perguntou a Dilma como ia “o cara”. Talvez tenha ido mais longe e perguntado que fim levou aquele Brasil que Lula representava. E os dois podem ter conversado sobre os efeitos do tempo até nas melhores intenções. E não seria de estranhar se Dilma se queixasse que o primeiro mandato do Lula tinha sido um sonho, do qual o Brasil acordara justamente no seu governo. E os dois concordassem que realmente, o mundo dá voltas demais.

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