05 de julho de 2015 | N° 18215
MARTHA MEDEIROS
SUTIÃS
Um sutiã pode ter um significado oculto. Funcionar como um
abraço apertado. Uma amarração.
Minha profissão traz poucas inconveniências e muitos
prazeres, o que torna o saldo altamente positivo. Uma das coisas a celebrar é o
contato que tenho com pessoas que, mesmo desconhecidas, estabelecem comigo uma
intimidade enriquecedora. Foi o caso de uma garota (acho que ainda posso chamar
uma socióloga de 45 anos de garota) com quem tive uma adorável conversa dias
atrás, no Rio de Janeiro.
Ela me contou sobre seu primeiro casamento e sua primeira
separação, do quanto ficou abalada, de como fez para se reerguer, de como foi o
processo todo. Fez um relato comovente de tudo o que aconteceu, mas não pude
deixar de ajustar o foco num detalhe rápido que ela mencionou, daqueles que a
gente costuma deixar passar batido. Em meio ao turbilhão de emoções que ela
narrava, me disse: Depois do fim, eu já nem sabia direito quem era, nunca usei
sutiã e de repente comecei a usar.
Encontramos metáforas onde menos se espera.
Separação: tem desamparo maior? Uma aposta que parecia estar
dando certo de repente começa a fazer água, alguém que para você era a pessoa
mais importante do mundo perde o protagonismo, a vida estruturada se dissolve,
o amor dá lugar à mágoa, e mesmo quando não há mágoa ainda assim existe um
abismo para se atravessar antes de chegar ao outro lado. Você precisa
reconstruir sua identidade, não é mais a esposa de, o marido de, o amor da vida
de alguém.
As declarações não se sustentaram, as promessas não
vingaram, o destino foi mais forte que a idealização: fez cada um seguir
carreira solo. Depois de tanta luta, tanta negociação, tantas tentativas de
manter o acordo, chega a hora em que é preciso entregar os pontos, não há mais
o que fazer a não ser partir e tentar de novo com outro alguém, quando as forças
voltarem.
Mas, até que elas voltem, quanto medo. Da solidão, da
saudade, do rumo desconhecido. Você agora é um, não dois. Já não tem quem
segure sua mão. Está solto. E essa soltura assusta. E se eu cair?
Um sutiã pode ter um significado oculto. Funcionar como um
abraço apertado. Uma amarração. Não usá-lo sempre foi uma atitude libertária,
até que, um belo dia, você descobre que a liberdade virou um bicho-papão e você
voltou a ser uma menininha assustada. O que mais deseja é se sentir presa,
segura, acolhida.
O desafio das separações é fazer com que voltemos a nos
sentir confortáveis com a soltura dos dias, confortáveis diante da incógnita do
futuro. Não sei no que os homens se seguram quando se separam (minto: sei, sim),
mas grande parte das mulheres recomeça a vida emocional se segurando nelas
mesmas. Só então, aos poucos, iniciam outra revolução, uma nova queima de sutiãs,
a fim de formar uma identidade mais firme que a anterior.
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