sábado, 18 de julho de 2015



18 de julho de 2015 | N° 18230 
DAVID COIMBRA

Como ler esta página até o fim

Li que a capacidade de concentração dos jovens humanos de hoje é menor do que a de um peixe de aquário. Achei sensacional, porque, veja: os cientistas conseguiram medir a capacidade de concentração de um peixe de aquário. Deve ter sido bem difícil.

Pois, afinal, quais são os interesses de um peixe de aquário? O que pode lhe capturar a concentração e mantê-la detida por mais tempo do que um adolescente Homo sapiens leva, por exemplo, para ler um texto de jornal?

Bem, todos os seres vivos temos, basicamente, três interesses, que Freud definiu como “casa, comida e sexo”. Por “casa”, entenda “segurança”, e, por comida e sexo, entenda comida e sexo. Então, um peixe de aquário se interessa por aquela ração que as pessoas jogam na água para eles, por alguma pedrinha onde ele vá se recolher na hora de dormir e, é claro, por peixas.

As pessoas subestimam os peixes, achando que eles não fazem sexo. Pois fazem. E digo mais: foram os peixes que inventaram o sexo, há pouco menos de 400 milhões de anos. Mais especificamente, foi um peixe lá da Escócia que começou a fazer sexo. Por que um peixe escocês? Por que ele decidiu investir nessa mudança radical de hábitos? São perguntas que os cientistas, tão espertos, haverão de responder.

Tais questões são fundamentais. Pense: antes do peixe escocês, os bichos largavam esperma na água, não havia o acasalamento propriamente dito. Menos divertido, sim, mas muitíssimo menos complicado. Se não precisássemos fazer sexo, 95% dos nossos problemas estariam resolvidos. Passaríamos os dias bebendo chope com os amigos, jogaríamos futebolzinho, veríamos as partidas do Brasileirão e, o mais importante, não existiriam comédias românticas, nem música sertaneja, você não teria de saber dançar, não teria de ir à balada, não teria de se casar, não teria sogra, não teria de comprar presentes no Dia dos Namorados, você só precisaria largar seu esperma por aí, a fêmea recolheria, reproduziria a espécie, e pronto. Vamos nos divertir!

Não sei por que aquele peixe escocês resolveu engrouvinhar tudo.

De qualquer forma, o fato é que aderimos a essa história de sexo e, pelo sexo, formamos famílias, aceitamos nos estabelecer, construímos a civilização e, com ela, adquirimos novas necessidades. Não podíamos mais apenas coletar ou caçar para comer, tínhamos de plantar e, assim, inventamos arados e, depois, colheitadeiras. Não podíamos mais depender só das pernas para nos deslocarmos e, assim, inventamos a roda e, depois, carros e, depois, aviões. 

Não podíamos só falar pessoalmente para nos comunicarmos e, assim, inventamos telégrafos e, depois, telefones e, depois, celulares e, depois, celulares com internet, até que, agora, por causa dos celulares com internet e da rapidez com que as informações chegam a eles, os jovens humanos não conseguem ficar concentrados por mais tempo do que um peixinho dourado fica observando o nadar rebolado daquela peixinha dourada serelepe.

Como resolver isso? Como fazer com que um jovem leia uma crônica de 40 linhas até o fim? Não adianta lutar contra o Facebook, o Instagram e o Whats. Melhor acabar de uma vez por todas com o sexo.

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