11 de julho de 2015 | N° 18223
NÍLSON SOUZA
NÓS E OS GREGOS
Não sei bem no que deu aquele movimento pelo retorno ao Hino
Rio-Grandense de um trecho suprimido durante o regime militar. Lembro que, para
variar, o debate em torno da reinserção da parte excluída virou um Gre-Nal
ideológico. Os defensores da volta diziam que o verso fora cortado porque
falava em “assombro dos tiranos”, ferindo a suscetibilidade dos generais de
plantão. Os partidários do corte alegavam que o povo não cantava a estrofe
retirada, além de inexistir qualquer relação entre os gaúchos e os gregos e
romanos, citados no verso. Era assim:
Entre nós reviva Atenas para assombro dos tiranos
Sejamos gregos na glória e na virtude, romanos
Tenho ouvido o nosso hino nos estádios de futebol e em algumas
cerimônias públicas. Ninguém canta esse verso. Acho até que ninguém mais quer
ser grego neste momento em que, paradoxalmente, os endividados helênicos mais
se parecem conosco – nas dificuldades econômicas, nos entreveros políticos e na
mania de grenalizar qualquer debate. A propósito, o último jogo entre o
Panathinaikos e o Olympiacos, que é realmente o Gre-Nal deles, terminou em
tanta pancadaria, que o governo se viu obrigado a suspender todos os
campeonatos de futebol do país.
Bem, mas voltemos ao nosso nada modesto hino. Por que o
autor da letra, o célebre Chiquinho da Vovó, recorreu à comparação com gregos e
romanos? Ora, porque Atenas sempre foi o símbolo da democracia. Os gregos
antigos, além de amantes da liberdade, eram reconhecidos como atletas,
artistas, filósofos e poetas. Já os romanos eram guerreiros imbatíveis. Como o
hino surgiu durante a Revolução Farroupilha, o letrista julgou apropriado
enaltecer a bravura dos farrapos, comparando-os com os pais da mitologia:
gregos na glória, romanos na virtude. E sirvam nossas façanhas de modelo a toda
terra.
A atual crise grega tem sido também uma oportunidade para a
revisão dos mitos e lendas da Antiguidade, pois as comparações se tornam
irresistíveis para cientistas políticos e jornalistas que analisam o episódio.
Tem até uma brincadeira de internet que mistura deuses e heróis mitológicos com
os problemas reais, A Crise Grega para Iniciantes. Vale conferir, é bem
engraçada.
Mas melhor seria que alguém fechasse logo esta caixa de
Pandora. Lá e aqui.
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