quarta-feira, 15 de julho de 2015



15 de julho de 2015 | N° 18227 
MÁRIO CORSO

Dio, come ti amo

A promoção era irresistível: em troca de dois rótulos de Omo, uma entrada para ver o filme Dio, come ti amo. Para quem não é da época, enchia cinemas como um Titanic. Tempos do blockbuster à parmegiana.

Elvira, a moça que trabalhava lá em casa, não pestanejou, recortou as embalagens e não pensava em outra coisa. O problema é que a barbada só valia nas matinés de dia de semana. Como fazer se uma das suas tarefas era cuidar de mim? Simples, levar-me junto.

E lá nos fomos, Elvira, eu e uma centena de outras jovens mulheres com seus passaportes de caixa de sabão em pó. Marca séria, além de lavar ainda mais branco, levava suas clientes fiéis ao cinema.

Esperto, saquei que se tratava de um filme religioso. Já tinha visto outros na escola. Seria mais uma mensagem sobre a benevolência do nosso criador e como Ele, apesar de não sermos merecedores, nos atura e nos ama. Enfim, fiquei contente com a quebra de rotina e, de inhapa, alimento espiritual.

O filme era italiano, percebi pelo título. Na minha família se falava um pouco de italiano. O que me ajudou na tradução de Dio foi o Porco Dio, uma das palavras de entusiasmo que escutava dos meus adultos, uma espécie de interjeição, servia para sublinhar momentos. Nunca entendi bem o sentido, duas coisas opostas, mas o padre nos dizia que religião é fé e fé é mistério. Portanto, existem coisas da religião que não entendemos. No meu caso particular, o mistério da fé se apresentava no Porco Dio. De qual natureza de Deus estavam a falar? Lembro também um expressivo e enigmático campo semântico que envolvia hóstia e cachorros, mas isso é outra história...

Na matiné, eu era o mais jovem da fila, talvez o único representante masculino e, ao meu ver, também o único que se comportava bem diante de um momento solene. Havia uma excitação no ar, estavam todas algariadas. Esperava mais seriedade, na missa ninguém se comporta assim.

O porteiro fez uma cara feia para mim. Não sei se era porque eu não tinha os cupons mágicos mas, pressionado pela multidão, e pela conversa da Elvira sobre a premência e importância de ela ver o filme, entramos. Depois Elvira me contou que ela e o porteiro eram conhecidos e outras coisas.

Começou o filme. Porco Dio, que religião estranha! Seria a mesma que a minha? Havia muitos olhares e muitos beijos, muitos e demorados beijos. Mas, na essência, era uma religião do amor, não havia dúvida. Havia uma moça que amava muito a Deus e a um rapaz e cantava isso para todos. Para não estragar a surpresa de quem não viu, não conto com quem ela ficou. Enfim, um enredo positivo, comovente, muitas choravam. Por isso não entendi por que minha mãe, quando soube que fui ver essa mensagem de fé e esperança no amor de Deus e dos homens, ficou tão braba com a Elvira. Coisas de mãe são como a fé, cheias de mistérios.

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