quinta-feira, 30 de julho de 2015



30 de julho de 2015 | N° 18242 
DAVID COIMBRA

Ela pintou o cabelo de azul

Conheci uma moça que pintava uma mecha dos seus cabelos de azul. Ela tinha a voz rouca e a pele morena. Namorava um amigo meu e, não, eu não a desejava, de forma alguma, mas admirava aquela pequena ousadia. Pintar o cabelo de azul, imagina. Estávamos nos anos 90, um tempo em que os cabelos não eram azuis. Hoje são.

Nos Estados Unidos, a todo mo

mento deparo com mulheres de cabelos coloridos. Curiosamente, as americanas do Norte não parecem tão vaidosas quanto as americanas do Sul. Não usam salto alto no dia a dia e vestem-se como quem pegou o primeiro pano que estava pendurado na cadeira, de manhã cedo. Na rua das cidades tipicamente americanas, você vê mulheres até de... moletom!

Outro dia, testemunhei a conversa entre uma italiana e uma francesa que se queixavam da forma como as americanas se vestem. Para uma italiana, o despojamento das americanas é revoltante, porque elas, italianas, se sentem constrangidas de exercitar sua natural faceirice latina. Realmente, realmente. Certa feita, passei a manhã de sábado sorvendo um cappuccino numa mesa de beira de calçada nas imediações da Piazza di Spagna, em Roma. O que assisti ali foi um dos mais glamorosos desfiles do gênero feminino da minha vida. Registrei, em especial, que as italianas apreciam entrar em justíssimas calças brancas.

Já as francesas exalam aquela elegância magra, aquela delicadeza decidida. Por algum motivo, acho que são um pouco brabas.

Já no interior americano, uma mulher que se enfeita muito durante o dia destoa das nativas e chama a atenção.

Claro, não estou falando de Nova York, por exemplo. Nova York, como Miami e Los Angeles, é uma cidade voltada para fora dos Estados Unidos. Você caminha pelas ruas da Big Apple e encontra mulheres paramentadas como se estivessem prestes a subir na passarela. Um dia, num final de tarde, perto do Relais de L’Entrecôte, avistei uma jovem longilínea, encarapitada em saltos de uns 15cm de altura, as longas pernas mal cobertas por uma minissaia de palmo e meio de largura, os olhos de felina examinando o mundo com enfaro, a maior cara de modelo. Eu a vi e fiquei nervoso.

Mas, nas pequenas cidades, agora, durante o verão do Hemisfério Norte, o que as mulheres fazem é meter-se em roupas sumárias, coisinhas mínimas mesmo, do tamanho da minissaia da modelo new yorker, com uma diferença importante: o gosto das americanas do interior é andar o dia inteiro com aqueles shorts de corrida. São shorts bem curtos e leves e de cores chamativas. Só que serão sempre comuns shorts de corrida, e elas os usam até para ir a bares. E, nas gramas das pracinhas, as mulheres estendem toalhas e se deitam de biquíni para tomar sol, tudo muito natural, não há nenhuma insinuação sedutora, nenhuma sugestão, nada.

Mas, entre a seminudez assexuada das americanas e a sensualidade aparatosa das italianas, prefiro a brasileira dada a atitudes como, numa primavera, por algum motivo, pintar um feixe dos seus cabelos negros de azul. Um mínimo atrevimento, uma rebeldia sutil, um rosnado de fêmea.

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