16 de julho de 2015 | N° 18228
DAVID COIMBRA
Batman x Super-Homem
Batman e Super-Homem vão se enfrentar em um filme do ano que
vem. Isso acabaria acontecendo algum dia. Qual menino não se perguntou quem
venceria, numa luta entre eles? E qual não respondeu que seria o Super-Homem?
Afinal, o Super-Homem voa, e o Batman no máximo salta longe; o Super-Homem tem
aquela visão de raio X que corta uma porta de aço ao meio, e o Batman vai
precisar de óculos quando chegar aos 50; o Super-Homem detém uma locomotiva com
os braços, e o Batman não seguraria o carro do Pato Donald. O Super-Homem tem
mais poderes. Óbvio.
Mas existe a criptonita.
Ah! Você não se lembrou da criptonita! E o Batman é um
cientista, é bem inteligente, pode derrotar o Super-Homem na astúcia.
Não leve livre, portanto. Clássicos são imprevisíveis.
Durante muito tempo, no Brasil, foi disputado o clássico
Chico x Caetano. O Caetano canta melhor; o Chico sempre encantou as mulheres
com os olhos verdes e o ar tímido. O Caetano faz uma poesia mais inquieta, mais
rebelde, às vezes experimental; o Chico é mais regular. O Chico, como
intelectual, toma posição sem muito comprometimento; o Caetano é contestador,
atuante e provocador por natureza.
O Caetano ainda está vivo, como os Stones; o Chico nem
tanto, como os Beatles. Só que, entre Stones e Beatles, sou Beatles. Beatles são
Mozart, Stones são Beethoven. Beatles são Pelé, Stones são Garrincha. Reconheço
a grandeza incomparável de Pelé, mas simpatizo mais com a genialidade brejeira
de Garrincha, com sua alegria em iludir o adversário, mais do que ganhar o
jogo, porque a vida não é ganhar o jogo, a vida é aproveitar o jogo. O
brasileiro sempre foi mais Garrincha do que Pelé, sempre preferiu sorver o jogo
a vencê-lo, mas a dor das derrotas seguidas foi tornando-o ansioso pela vitória.
De uns tempos para cá, o brasileiro quis ser Pelé, e não é, nunca será. Aí a
ansiedade tornou-se amargura, e o brasileiro deixou de ser Garrincha, sem virar
Pelé; transformou-se em Dunga.
Ah, suaves os tempos em que todos éramos meninos nos
empolgando com duelos de ficção. Ou nem tanto de ficção e nem tanto duelos de
meninos. Loiras ou morenas? Vinho ou cerveja? Verão ou inverno? Azul ou
vermelho? Você faz suas escolhas, mas não significa que não as trairá. Podemos
mudar de ideia, embora tenhamos nossas convicções pétreas. É evidente que O Poderoso
Chefão é o melhor filme de todos os tempos. É evidente que Paris tem a mais
bela arquitetura, e o Rio, a mais bela paisagem.
É evidente que Marilyn Monroe é
o Pelé das atrizes de cinema, mas tenho uma queda por Jacqueline Bisset, uma
mulher discreta, elegante, vaporosa e superior, como tem de ser uma grande
mulher. Jacqueline Bisset não grita,
Jacqueline Bisset não se altera, Jacqueline Bisset mal ri. Jacqueline
Bisset não vai, os outros vêm a ela. Ela não é um Pelé, nem um Garrincha, muito
menos um Maradona; é um Zinedine Zidane que não dá cabeçada no peito do
zagueiro, um Beckenbauer que não conhece a cor da grama por nunca ter olhado
para baixo para jogar, um Didi que se orgulha de jamais ter pisado na bola.
Quem
poderia enfrentar Bisset? Talvez Deneuve. Talvez. Mas Deneuve é mais prosa e
Bisset é mais poesia, embora eu prefira a prosa à poesia, prefira a história
bem narrada à ficção elaborada, prefira um Durant a um Fitzgerald, um Ceram a
um Grass, se bem que dos alemães sou mais Remarque, que mistura as duas,
realidade e ficção, que foi de onde parti, da ficção: Batman versus Super-Homem.
Quem vencerá? Isso não nos inquieta mais, a nós, brasileiros. Não somos mais
meninos. Eram bons os nossos tempos de meninos.
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