06 de julho de 2015 | N° 18216
ARTIGO - NELSON JOBIM*
A MAGISTRATURA
O nosso Poder Judiciário é de tradição continental europeia.
Lá, as mudanças vieram com a Revolução Francesa. Até então, o conflito entre a
magistratura e o rei foi uma característica final do velho regime.
A burguesia havia se introduzido na magistratura para, pela
sentença, negar vigência às normas oriundas da aristocracia. Foi o momento do “Parlement
de Paris”, cuja oposição ao Regime foi estimulada pelos revolucionários
emergentes.
Vitoriosa a Revolução, mudou o relacionamento desta com os
magistrados. Passaram estes a ser vistos como funcionários que tinham o dever
de aplicar o direito positivo – a lei – criado pela Assembleia Nacional, única
representante dos interesses populares.
Não poderia a magistratura sobrepor-se ao povo, única origem
do poder, que se reunia na Assembleia Nacional. Assim, estrutura-se uma
magistratura de modelo burocrático e piramidal, cuja função era aplicar a lei
ao caso concreto, sem se desviar daquela.
Os conteúdos das sentenças dos juízes nada mais eram do que
o resultado de uma operação lógica: a lei, os fatos e a conclusão, como aplicação
da primeira sobre a segunda.
Não tinha o juiz nenhuma responsabilidade quanto a sua
conclusão, pois, com rigor conceitual, tal conclusão não era propriamente sua,
mas de comando legal. Consequências. Burocratizou-se a magistratura: instituiu-se
o concurso público, tal qual nos quadros da administração; estruturou-se em
carreira, como os funcionários; estabeleceu-se uma hierarquia funcional.
O juiz não é mediador que solucione o conflito. É titular de
poder que “dá a sentença”. O concurso privilegia diplomas acadêmicos, em
especial os das “Escolas de Magistratura”. Exige-se competência prometida e não
demonstrada pela prática.
A efetiva experiência profissional vale menos. Outra é a
responsabilidade só disciplinar. Os desvios se situam na atividade de decidir,
passível, unicamente, de apuração disciplinar. A realidade, de fato, não é assim.
A sociedade tem que dispor de mecanismo de controle de todas
as suas instituições de poder. Todas devem ter o dever social de prestar contas.
Jurista, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal*
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