04 de julho de 2015 | N° 18214
DAVID COIMBRA
O último desejo
Entre todas as ocorrências extraordinárias que se deram em 11
de setembro de 2001, quando as Torres Gêmeas foram derretidas e a História
mudou para sempre, entre tudo aquilo que o mundo jamais esquecerá houve um naco
de fato, tão somente uma frase, que foi, na verdade, uma grandiosa demonstração
do que há de melhor na humanidade.
Foi o que disseram os que iam morrer.
Pensei nisso ao ler a robusta reportagem que será publicada
hoje no site e amanhã na versão impressa de Zero Hora, de autoria da minha
amiga Larissa Roso. A matéria intitula-se “Últimos desejos”.
Durante um ano, Larissa acompanhou pacientes com câncer que,
em determinado momento, descobriram que a morte estava próxima. A esses
pacientes, não era mais dada a esperança de sobrevida, apenas a certeza de que
os médicos trabalhariam para que a morte lhes fosse leve. Quer dizer: trabalhariam
para que houvesse o mínimo de dor e o máximo de conforto. Uma das formas de
confortá-los era, exatamente, concedendo-lhes o último desejo. Ou, pelo menos,
tentando lhes conceder.
Larissa se surpreendeu com a natureza singela e sentimental
dos desejos. Uns queriam apenas dormir na própria cama, até a noite do sono
derradeiro. Outros, a chance de afagar seus bichos de estimação. Houve quem
ansiasse pelo prazer de acomodar-se numa cadeira no pátio de casa para sorver
um chimarrão.
Alguns sonhavam em preparar um jantar para as pessoas que
amavam, uma comidinha caseira, um galeto, uma massa à carbonara... Uma mãe
desejava experimentar de novo a sensação de pentear os cabelos da filha. Um
filho só pensava em rever o pai, que não via há mais de 20 anos.
Em todos, a mesma vontade de dar, mais do que receber. A
mesma ânsia de amor e de paz.
Eu sabia disso, Larissa. Sabia.
Por causa daquele 11 de setembro de 2001.
Naquela manhã, alguns passageiros dos aviões sequestrados
sabiam que iam morrer, assim como muitos dos homens, mulheres e crianças que
ficaram presos no incêndio das Torres Gêmeas. Estávamos em 2001. Praticamente
todas aquelas pessoas tinham um celular ao alcance da mão. E foi ao celular que
elas acorreram. Ligaram para seus afetos.
Tinham poucos segundos para exprimir seus últimos desejos,
dar suas últimas determinações, fazer confissões, talvez, ou um desabafo final.
E todas elas, praticamente sem exceção, disseram a mesma frase, com pequenas
variações. Todas aquelas pessoas, no momento mais importante de suas vidas, que
é o momento derradeiro, só pensaram em uma coisa: em falar com outra pessoa e
declarar, simplesmente: “Eu te amo”.
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