30
de junho de 2014 | N° 17845
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
O IMPREVISTO PRESIDIU OS
ACONTECIMENTOS
A
circunstância de dois ilustres homens públicos terem anunciado seu propósito de
não disputar nova eleição lembrou-me que, com isto, o país ficou privado de
personalidades de inegável experiência. Pareceu-me que, com a decisão personalíssima
dos dois políticos, a nação sofreu o que se poderia chamar de desperdício,
perdendo o que não se encontra no mercado, nem a peso de ouro.
Não
preciso lembrar aos gaúchos que Pedro Simon atravessou mais de meio século de
vida pública sem ter sido alvo de uma nódoa e com o respeito de seus colegas e
inclusive de seus adversários. Quanto ao presidente José Sarney, que encerra
sua carreira de quase 60 anos, limitar-me-ei a apreciá-lo como presidente, o
que constituiu uma mudança na sua vida e foi a mais exaustiva das provas.
Na
eleição congressual na sucessão do presidente general Figueiredo, a chapa da
oposição foi composta por Tancredo Neves e José Sarney. Como é notório, o
presidente eleito, na noite anterior à posse, foi operado com urgência, vindo a
falecer dentro de algumas semanas, razão pela qual o vice-presidente, eleito
para substituí-lo nos impedimentos e sucedê-lo na vacância do cargo, viu-se
investido na presidência da República.
O
imprevisto presidiu os acontecimentos. A meu juízo, e na medida das informações
que armazenei, o novel presidente, deixando à margem todos os antecedentes da
sua vida, imbuiu-se da singularidade da sua investidura, exercendo o governo
como se fora uma espécie de testamentário. De início, manteve o ministério
escolhido por Tancredo, só alterado quando as eleições levaram alguns ministros
a buscarem novos cargos. Na sua mesa de trabalho, colocou a relação de todos os
compromissos assumidos por Tancredo e passou a cumpri-los, rigorosamente,
executando-os sem alarde.
Segundo
a Constituição da Itália, quem foi presidente da República (e na Itália vige o
regime parlamentar, segundo o qual o presidente da República é tão só o chefe
de Estado) passa a ser senador vitalício. Cada presidente da República possui
também a prerrogativa de nomear cinco senadores vitalícios que tenham “enaltecido
a pátria em virtude de elevadíssimos méritos no campo social, científico, artístico
e literário”. Atualmente, esses incluem, entre outros, um maestro, um
arquiteto, um físico e uma neurobiologista, todos de renome internacional.
Não
estou a propor a imitação italiana, mas limito-me a mostrar tentativas de
inovar procedimentos benfazejos. Não estou a propor a imitação italiana
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF